sexta-feira, 26 de outubro de 2007

O ADEUS IMPOSSÍVEL

Tardiamente eu encontrei tempo para assistir a "Antes do Amanhecer" (Before Sunrise/1995). Bom, "tempo" não é a palavra ideal, no fim das contas. Eu simplesmente não assisti. Talvez por falta de vontade, oportunidade ou mesmo por não ter sido atraído pelo filme por mais que tanto se falasse sobre ele e sua continuação, "Before Sunset". Lamento por isso. Terrivelmente. Tivesse eu visto em outro momento, digo bem antes, a silenciosa história, contada por Ethan Hawke e Julie Delpy (maravilhosos juntos) teria sido muito mais impactado. Não que a pele tenha ficado mais grossa e o coração mais incrédulo. É que o filme teria me acertado em cheio num momento crucial em que entendi a minha dificuldade em lidar com o adeus, com a despedida, com deixar algo, alguém, para trás. E isso me acompanhou (e acompanha) por toda a vida. Minha angústia mais constante e recorrente. Não aprendi a me despedir, não sei dizer adeus e deixar coisas no caminho é como desprender-me de pedaços que vou sentindo falta quanto mais adiante vou seguindo: amigos, lembranças da infância, momentos mágicos, viagens. Flashbacks perfeitamente editados na minha mente que parecem correr ao som de "I will remember you", da Sarah Mclachlan quando assisto a filmes como este, "Antes do Amanhecer" e tantos, tantos outros ("Encontros e Desencontros" é o expoente máximo disso). Não sei se todas as pessoas são assim. Algumas felizardas provavelmente não, por que não se dão o trabalho de serem "lost", de enxergar a vida por prismas mais coloridos, mais profundos, uma vez que a superficialidade dos dias iguais já basta. Eu, felizmente, sou fundamentado numa "lostness" tão minha, que me impede de seguir a vida sem cronicá-la e faz com que eu sucumba em pensamentos imensamente reflexivos quando assisto a um filme como "Antes do Amanhecer". Não quero dizer aqui que o filme seja algo especial, melhor de todos os tempos ou coisa assim. Não é isso. É a essência, a humanidade. A triste certeza que temos de que nada é eterno, tudo é passagem, é efêmero. A impossibilidade de eternizar tudo aquilo que nos é especial. Mesmo tendo passado algumas poucas horas juntos, o abraço de despedida de Jesse e Celine é desesperado e comovente, como se tivessem vivido uma eternidade juntos e fossem se perder para sempre. Beijos famintos para aproveitar cada segundo, cada último segundo juntos antes do trem que a leva para Paris partir. Só quem viveu um amor à distância sabe sentir esta cena. E eu sei. A trajetória solitária de Jesse, saindo da estação rumo ao aeroporto é filosofia urbana: todos os lugares que, horas antes, haviam sido habitados por eles enquanto construíam as melhores e mais inesquecíveis lembranças, agora vazios enquanto ele passa de ônibus. Por que não há mais ninguém lá, eles tampouco, e a cidade de Viena acorda para mais um dia como outro qualquer. Os dois seguem destinos opostos, solitários. Com o cheiro e a lembrança ainda muito vivos. Estão completamente perdidos na idéia de que viveram um sonho e voltaram à realidade. Viveram um tempo à parte, alheio, só deles. Um olhar à janela traz a meditação de quem se agarra desesperadamente às lembranças ainda frescas. Melancolia que traz lágrimas aos olhos, mas faz sorrir. O coração quebrado em mil pedaços, mas orgulhoso por ter vivido algo tão incomum e extraordinário. Sofrimento inevitável como contrapartida de uma lembrança especial, por que a vida segue seu rumo, como um trem, e nos acolhemos na esperança de reencontros que não aplaca a idéia angustiante de que algo ficou para trás. Algo que talvez nunca mais tenhamos de volta.

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