Ele acordou cedo, como era costume. Os raios tímidos de luz avançando lentamente, vencendo a escuridão do quarto, centímetro por centímetro; o seu corpo pedindo por café, os seus músculos ainda relutantes a levantar. Aquele silêncio típico de uma manhã de domingo.
Virou-se de lado, para observar a sua mulher, adormecida ao seu lado. A silhueta andina, leonina. Os cabelos lisos, compridos, escorrendo pelas costas. A camiseta de banda surrada que ela gostava de usar, a calcinha pequena, marcando o contorno de curvas perfeitas, linhas de pernas compridas, de nádegas bem desenhadas, cobertas por pêlos dourados. A visão mexia com o seu corpo de forma imediata, como o pressionar de um botão.
Aquela pele, aquele cheiro, aquele gosto, aquela mulher.
Continuou ali, contemplando a visão; a sua respiração tranquila, indefesa, quase inocente. Passou os olhos de ponta a ponta, os pés cobertos por meias descasadas, as pernas enroladas numa mistura disforme de cobertor e travesseiros, as mãos escondidas sob o cabelo. A boca carnuda, vermelha, entreaberta, os olhos cerrados, ainda desenhados pela maquiagem da noite anterior, a cabeleira elegantemente desgrenhada, como uma princesa-vampira, de ressaca.
Aproximou o rosto, como se fosse beijá-la. Não. Permaneceu parado, a poucos centímetros, como um predador. Apenas para sentir o aroma, aquela mistura de suor doce e perfume caro, o hálito que ele conhecia como o seu, o cheiro que emanava dos poros, que o deixava selvagem, que o fazia querer aquela mulher como o raio deseja a terra na tempestade.
"Esta é a minha mulher", pensou. "A origem e o fim do meu desejo. Minha pergunta sem resposta".
Fechou os olhos. Um suspiro.
E imaginou como seria esmagar a sua linda cabeça contra a parede de concreto.
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