terça-feira, 14 de abril de 2015

CARTA PARA L.


Quando eu penso em Lídia, não são pensamentos comuns, banais, estes que todo mundo têm, que invadem a minha mente; não são aquelas fotografias que todo mundo tira em algum momento da vida, ou as experiências similares de viagens, datas especiais, restaurantes. 

Não.

Quando eu penso em Lídia, são as sensações que invadem o meu corpo e me sequestram a alma, como na primeira vez que eu a vi. É o seu cabelo negro, comprido, selvagem, com cheiro de primavera, brisa do mar e mistério. É o toque suave da sua pele, os pêlos roçando a palma da minha mão, o gosto da sua boca afogando a minha, como se não tivéssemos mais tempo. 

O seu corpo, leve, frágil, branco, salpicado de sardas; as linhas perfeitas da sua nudez, revelada sem pudor desde a primeira noite. A água morna escorrendo sobre nós, o mar de lençóis, o chão áspero. Quando eu penso em Lídia eu sinto o gosto da sua saliva, viva, misturada na minha; o suor doce, escondido nos confins do seu pescoço, o sabor marcante do meio das suas pernas envolvendo os meus lábios sedentos como feitiço.

As músicas tocadas em loop, a trilha sonora do nosso entorpecimento. Quando eu penso em Lídia é como se eu pudesse escutar a sua voz, alojada nos meus ouvidos; aquela voz rouca, cheia de segredo, senhora dos meus arrepios mais inesperados. Aquele nome, brilhando na tela do meu telefone, rasgando o meu sono em pedaços.

"Eu posso ir para aí?".

A linha delicada, minha avenida sem nome; o percurso que começava gentilmente entre o meio dos seios pequenos, rosados como dois pêssegos, ao umbigo, desenhado como um losango numa folha em branco, alguns sinais equilibrados deliciosamente ao redor, até a parada final, o seu ventre, encaixado na minha cintura, tomando posse do meu corpo; eu, ali, seu prêmio, sua colônia. Sua conquista. 

"Eu pertenço a você".

Quando eu penso em Lídia sinto o cheiro do meu perfume, misturado ao seu, na minha camisa de trabalho, usada, roubada, vestida como uma mortalha, grande demais para seu corpo feminino, mínimo. Sinto gosto de café, fresco, negro, forte; e de pães cortados de forma irregular, devorados de forma descuidada; as migalhas espalhadas no chão, risos matinais, planos que não seriam cumpridos. 

Sua caligrafia, alienígena, me deixando recados aleatórios, sem sentido. Seus presentes fabricados, suas ideias sem nexo, seu olhar preso ao meu, na porta, complexo. 

Seu sexo.

Quando eu penso em Lídia sinto a sua respiração morna, entrecortada, se confundindo com a minha. Respirando, conspirando. Seu grito contido, suas unhas abrindo caminhos sem rumo nas minhas costas. Beijos bêbados, com gosto de vinho caro, anunciando juras, promessas de sal e limão. Abraços apaixonados, nós dois misturados, sem começo nem fim, uma coisa só, colada, feito construção, sobre a cama. Nossa cama.

Quando eu penso em Lídia é como se perdesse o caminho de volta para mim mesmo. Viro um ser de janela, emoldurado; percebo o café frio na minha mão. Jogo-o fora, faço tudo de novo. Um vazio, uma saudade que não passa, um pedaço de mim, perdido, para sempre. 

Lídia, Lídia, Lídia. As letras saboreadas, enroladas na minha língua, como uma prece. Um amor repentino, inesperado, breve, devastador. 

Como deve ser.

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