Uma mulher, estrangeira, sussurrando as suas reflexões de amor - e de ódio - sobre um homem silencioso que ela nunca esqueceu. Um padre, sedento de fé, desesperado por um sinal da existência de Deus. Um homem, inerte, quase indiferente, e que inevitavelmente seduz e esmaga as mulheres que o amam vorazmente. Uma mulher, em lutos, na solidão da reconstrução de um rancho, dividida entre a culpa e o desejo. É sobre a (folgada) costura entre estas diversas histórias que fala "To the wonder", novo filme de Terrence Malick (de "A árvore da vida").
Fica difícil falar muito sobre um filme que, em si, quase não fala. Ao mesmo tempo, não quero dizer com isso que este é um filme "mudo" ou que não chega a lugar algum. Bem o oposto. Como "A árvore da vida", "To the wonder" é absurdamente belo, sinestésico, sussurrado, como se fizéssemos parte de um segredo, em que observamos aquelas vidas com muito mais voyerismo do que envolvimento.
Em poucas palavras, acredito que este seja um filme sobre amor. Ou a falta dele, ou a busca por ele. Ou sobre a sua degradação que, como tudo que é vivo, também morre. Começamos o filme com uma linda e passional história de amor, em que uma francesa e um americano se derretem na França. Ela quase canta o seu amor por aquele homem, estrangeiro, silencioso, americano, e o seu desejo de fugir e passar a vida com ele.
Em paralelo, entendemos - no "presente" - que aquela história acabou. E, neste momento, conhecemos uma americana, que está se envolvendo com o mesmo homem e, inevitavelmente, sofrendo com a sua incapacidade de amar. E, orbitando este universo de amores tão fragmentados, está um padre, errante, desesperado por encontrar a sua fé, achar o Cristo que ele tanto prega.
Um filme absurdamente belo, como é de se esperar de Malick. Um filme sobre o prazer e a dor de amar
É tão difícil explicar os filmes de Malick... O título é perfeito. É uma questão de "maravilhamento". Como a primeira mulher de fato diz, ao descrever a sua história de amor: "nós subimos juntos a escada rumo ao maravilhamento". É exatamente isso o que fazemos, numa trajetória em que é fácil compartilhar da ansiedade, da inquietude, do desespero que habitam as histórias de amor profundas.
Estou cada vez mais convencido de que ele é um dos diretores (e roteiristas) mais especiais desta época. Malick é um "alquimista da beleza" e converte os seus filmes não em narrativas diretas, linerares, mas em exposições caleidoscópicas de imagens, sons e sensações. Os seus filmes são sinestésicos, imersivos, silenciosos e é preciso embarcar na sua jornada, beber da sua poção, e realmente se entregar para absorver (e "entender") o filme.
Não é uma questão de apontar um "final", seja ele feliz ou triste, mas de expor a existência sobre diferentes ângulos que, em determinados momentos, se cruzam (colidem) como assim a vida é. O amor é a espinha dorsal em torno da qual este lindo filme se constrói. Não é um filme fácil de se gostar e muitos julgarão desnecessariamente poético - ou pretensioso. Mas é uma experiência inesquecível para quem o aceitar.
Um filme comovente, duro, emocionante, penetrante, dolorido, como as lembranças podem ser.
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