terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A MINHA TERAPIA

A minha terapia está em acordar e, realmente, não me importar em ir para o meu trabalho; melhor, gostar de ir para o meu trabalho. Gostar do que faço. É rir com os poucos - e bons - amigos. Andar de kart, falar de filme, rir de bobagens sem muita graça. É aguardar a hora do almoço, como criança. É dormir abraçado com a minha gatinha, entorpecido por um carinho gratuito de um ser não falante que depende de mim para sobreviver. 

É cantar uma canção no meu carro, sem pudor. É andar no meu carro. É fazer um sanduíche de queijo e geléia para tomar com café fresco e achar essa a melhor refeição do planeta. É ver algo bonito. É ler algo bonito, que me dá vontade de chorar. É chorar aquele choro gostoso, de purificação, que parece lavar o peso da alma aprisionado atrás dos meus olhos. 

É sorrir com meus filmes velhos, repetidos. É descobrir um filme novo que, rapidamente, se transforma no filme mais importante da minha vida. É gargalhar com as bobagens que só eu pareço achar graça. É conversar amenidades com uma senhora simpática no supermercado que me lembra a minha vó. É ir ao supermercado. É ler meu livro preferido, depositando-o cuidadosamente ao meu lado, ansioso pelo que ainda pode acontecer. 

É aguardar pela visita da minha mãe. É fazer a minha mudança, como um ritual religioso de quem aguarda a nova - e boa - surpresa da vida. É jogar os meus jogos solitários, numa catarse ao final do meu dia. Como se eu não tivesse problemas. É comer pão de queijo. É dormir o sono dos justos, aquele sono profundo que só quem não faz mal a ninguém consegue dormir. É sorrir para um estranho. Ou uma estranha. É fazer algo bom. É fazer algo bonito. É amar irremediavelmente, com a certeza inquestionável de que sou amado de volta. Na mesma proporção. Ou pelo menos aguardar para que um dia eu descubra realmente como é isso.

É escrever o que meus dedos parecem ditar, como se pensassem por mim. É ligar a televisão, num canal aleatório, e assistir a algo que realmente gostaria de ver. É mexer nas minhas fotografias. É refletir sobre as coisas antigas, sobre o que passou, sobre o que não volta mais. Por mais que isso me machuque. É acordar com chuva na janela. Ou com sol, quando tenho uma das minhas errâncias desimportantes e inadiáveis. 

É conversar com as pessoas que amo, muitas das quais nem sabem que as amo. Ou o quanto. É refletir sobre a metafísica dor de existir e, mesmo me afligindo mais do que o necessário, confortar o meu peito com a certeza infantil de que tudo dará certo. É expulsar as borboletas que vez ou outra nublam meu peito com pensamentos sombrios. 

É comprar algo que sempre quis - e muitas vezes nem sabia que queria - e ainda pagando pouco por isso. Ou caro, às vezes. É cozinhar o pouco que sei e que gosto. É abraçar a minha própria companhia em momentos de solidão quando me sinto a pessoa mais feliz do mundo por, justamente, me conhecer. É me entregar à arte, à poesia, ao cinema, à música, porque na arte encontro uma pedra de salvação, que tenho certeza que é o que me impede de enlouquecer. É saber que ainda existe gente boa neste mundo esquisito, de gente esquisita.

É ser feliz com pouco. E ser feliz com a ideia de que não quero muito mais do que já tenho. É celebrar as minhas vitórias, dando um tapinha nas minhas próprias costas, quando ninguém, só eu, parece perceber o meu feito. É ser o adulto mais chato e responsável do mundo, sabendo que há também um menino dentro de mim que ainda se veste com inocências e capas de super-herói. 

Minha terapia é sentar aqui, onde estou, trabalhando essas linhas sem ordem, sem começo nem fim, num dia tão longo quanto o de hoje. Minha terapia. Meu treino. Meu reino. Minha brincadeira de ser adulto. Meu medo de existir. O que me ajuda a seguir em frente. 

Como vento nas velas. Como combustível de foguete.

Um comentário:

ione gonzalez disse...

Feliz de ler este texto.Feliz.