quinta-feira, 6 de março de 2008

HÁ UMA GUERRA LÁ FORA


Fico com essa impressão, vez ou outra, num dia qualquer. Uma mistura de reflexão-reação imediata ao mundo conforme a construção do meu dia. Tudo termina bem quando começa bem, dizem. E o mesmo vale para o contrário? Possivelmente. E tenho quase certeza que é justamente nestes casos em que as lentes para a percepção das coisas me dá os meios para enxergá-las como são. E aí me vem a certeza: há uma guerra lá fora. As músicas no tocador de MP3 não são as que quero ouvir naquele determinado momento e a passagem ininterrupta das faixas geralmente me leva ao quase atropelamento. Bom, infeliz casualidade. As poças ficam mais fundas e a sujeira da caminhada na rua parece ficar mais barrenta. Ok, vejo um dálmata velhinho e isso me conforta, produzindo um riso de canto de olho. Sinto alguma fome, alguma sede e a cota de café parece não ter atingido o ponto mínimo. Meio como andar na reserva. Mais ou menos isso. Então percebo que o calor do sol está mais intenso e o suor resultante mais insuportável. E com isso a paciência vai desaparecendo como mágica, e pelo ralo, com ela, a tolerância às pessoas diversas que, como eu, também estão tentando atravessar a guerra. Vejo, então, como ninguém está nem aí para ninguém. Pessoas idosas sem auxílio, pastas caídas que espalham documentos no chão sem que ninguém se manifeste em ajudar, cortadas irresponsáveis no trânsito e uma onda constante de mau-humor que vai coagulando no tal inconsciente-consciente-onisciente coletivo, como uma amálgama de má vontade e irritação. E eu faço parte dela. Ora, há uma guerra lá fora e faço parte dela. A conseqüência direta disso é que às vezes sinto como se eu, também, não me importasse. Pelo menos, não o suficiente. E protejo os meus ombros, e daí o que acontece aos lados? Mas luto contra isso, verdadeiramente. Por que há a guerra dentro da guerra, em que sou espião e contra-espião de mim mesmo, de meu próprio espírito dividido esquizofrenicamente entre o pacífico e o bélico. E cedo lugares, e dou passagem, e me ofereço, prontifico, ajudo a carregar. Dou "bom dias" gratuitos e sorrisos sem pretensão. E abandono a ironia e a observação cáustica e venenosa das coisas. É a contra-guerra. Contra-regra. E oscilo entre o bem e o mal, entre as duas metades que tenho em mim, que se completam como dia e noite, numa luta desequilibrada de pesos na balança das minhas reações. Mas sou bom a maior parte do tempo. Sei disso. Mas é inevitável e impossível não ceder aos extremos. Por que assim é na guerra. Vamos aos extremos da nossa humanidade e animalidade conflitantes; a guerra em nós. E isso é apenas um dia entre 365. Am I getting sour with age?

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