Defendo que é impossível não se apaixonar pela animação Disney-Pixar, "Ratatouille" (2007). O desenho é impecável e, como dizem, o mais realista feito até hoje. Mas, francamente, não me importa muito a tecnicalidade. A história é deliciosa. Um ratinho que sonha ser chef de cozinha em Paris. E consegue. A união harmoniosa de idéias tão opostas: um rato (sujeira) e a cozinha (limpeza). E, em nenhum momento, nós questionamos a legitimidade do sonho do pequenino Remy que, modestamente, admite que cozinha muito bem. O desenho comunica a alma de todos ali e, certamente, a do seu personagem principal. É impossível não sucumbir ao desejo de entrar na tela e abraçar esse ratinho esperto, carismático e aventureiro que não se deixa intimidar pela quase impossibilidade do que deseja fazer. Li que o desenho é um marco provável no cinema, a ponto de ser um possível indicado ao Oscar de melhor FILME e não de "ANIMAÇÃO". Merecidamente. Desenhos e histórias tão mágicas e delicadas como essa, sobretudo no mundo em que vivemos, só reforça a idéia de que temos muito a agradecer ao mago Walt Disney por, ele mesmo, ter acreditado no seu sonho impossível.
sexta-feira, 30 de novembro de 2007
quinta-feira, 29 de novembro de 2007
WALL-E
Recentemente tomei conhecimento da próxima animação Disney-Pixar a ser lançada nos Estados Unidos (em princípio junho de 2008). Trata-se de WALL-E. Sou fascinado por animações (as clássicas da Disney e as animações modernas) e fiquei extremamente interessado nessa história. Pelo que contam as breves sinopses, no ano de 2700 a terra estará completamente coberta de lixo e entulho, negligenciada por seus habitantes. A humanidade (o que sobrou dela) parte para o espaço, deixando unidades de limpeza (robôs) para limpar e tornar o planeta menos tóxico. Enquanto esperam, a terra se torna um lugar vazio, solitário e silencioso, apenas habitado pelas pequeninas unidades "Wall-E" ("Waste Allocation Load Lifters - Earth") que atravessam os séculos com a tarefa de compactar e limpar, compactar e limpar até que o planeta volte a ser habitável. Com o tempo, uma a uma vão quebrando até que apenas uma sobra (a que dá título ao filme). A animação contará a trajetória solitária do pequeno robô Wall-E, que continua sua limpeza, sem cessar, enquanto olha para o céu na esperança de retorno dos homens à terra. Acompanhado por uma barata chamada "Spot" (bem que dizem que só elas sobreviverão), Wall-E vai colecionando objetos e lembranças dos homens. Um belo dia uma nave deixa na terra a unidade-robô "Eve", por quem o solitário robô irá se "apaixonar". Por fim, uma "história de amor", esperança e despedida, com mínimos diálogos e uma mais do que bem vinda reflexão sobre os rumos que estamos tomando no nosso planeta.
segunda-feira, 26 de novembro de 2007
VIAGEM À DARJEELING
Minha impressão sobre "Viagem à Darjeeling" (The Darjeeling Limited/2007) é dividida, um pouco confusa, não muito decidida, devo confessar. Aguardei ansiosamente pelo filme e fui ver já na estréia. Por fim, não atendeu às minhas expectativas (que tinha certeza que seriam superadas), tampouco me decepcionou. Acho que existe uma série de brilhantismos inegáveis e, por ser fã do trabalho do Wes Anderson, defendo que muito do filme merece ser celebrado. As câmeras lentas são belas e toda a idéia em torno do trem (o que é a grande metáfora do filme) é absolutamente genial. O filme já é "um trem andando" e cabe a nós embarcar ou não - o que certamente vai influenciar o quanto vamos apreciar (ou não) a história dos três irmãos na jornada existencialista pelo coração da Índia. A comovente cena com Adrien Brody chorando escondido no banheiro, após ler o conto do seu irmão, é encantadora. Uma outra questão crucial é a trilha sonora, muito fraca. Num filme como esses, a trilha exerce um papel fundamental, como quase coadjuvante, tocando as cenas, organizando as nossas emoções, marcando o compasso das seqüências. E nesse aspecto, o filme é extremamente falho, quase oco, o que faz com que muitas emoções se percam desnecessariamente (a seqüência dos funerais, por exemplo, com uma boa trilha teria sido inesquecível). No fim das contas, "Viagem à Darjeeling" é um filme de muitas coisas boas costuradas juntas, mas com falhas e buracos espalhados e perceptíveis, como uma colcha de retalhos costurada a 3 mãos (o que reflete o grande problema do filme: ter sido escrito por três pessoas). Por causa da multiplicidade de idéias, o filme perde um pouco a "essência do Wes Anderson", sempre "lost" e melancólico, com pitadas de humor e sátira. Existem idéias estrangeiras ali, que parecem comprometer a força do filme, sua identidade. Mas não é um trabalho perdido, longe disso. É uma jornada que merece ser tomada, seguida e aprecidada, que, como qualquer viagem, tem episódios que desejamos esquecer e lembranças que guardaremos para o resto da vida.
sexta-feira, 23 de novembro de 2007
APAIXONADOS INCOMPREENDIDOS
("O Vampiro", E. Munch)
Tu que, como uma punhalada, entraste em meu coração triste; Tu que, forte como manada de demônios, louca surgiste, para no espírito humilhado encontrar o leito e o ascendente; Infame a que eu estou atado tal como o forçado à corrente, como ao baralho o jogador, como à garrafa o borrachão, como os vermes a podridão, maldita sejas, como for!Implorei ao punhal veloz que me concedesse a alforria, disse após ao veneno atroz que me amparasse a covardia. Ah! pobre! O veneno e o punhalisseram-me de ar zombeteiro: “Ninguém te livrará afinal de teu maldito cativeiro. Ah! imbecil - de teu retiro se te livrássemos um dia, teu beijo ressuscitaria o cadáver de teu vampiro!
O VAMPIRO (Baudelaire)
Tu que, como uma punhalada, entraste em meu coração triste; Tu que, forte como manada de demônios, louca surgiste, para no espírito humilhado encontrar o leito e o ascendente; Infame a que eu estou atado tal como o forçado à corrente, como ao baralho o jogador, como à garrafa o borrachão, como os vermes a podridão, maldita sejas, como for!Implorei ao punhal veloz que me concedesse a alforria, disse após ao veneno atroz que me amparasse a covardia. Ah! pobre! O veneno e o punhalisseram-me de ar zombeteiro: “Ninguém te livrará afinal de teu maldito cativeiro. Ah! imbecil - de teu retiro se te livrássemos um dia, teu beijo ressuscitaria o cadáver de teu vampiro!
* * *
Incompreendidos apaixonados são os vampiros. Desesperadamente apegados à "vida" ao ponto de a negligenciarem por completo em nome da eternidade. A eternidade possível, não importa a que custo. Românticos, solitários, filósofos, sábios, velhos, muito velhos. Atravessam o tempo, cronicando a existência humana, olhando de longe aquilo que não podem ter apesar de já em exceço desfrutarem. A relatividade da existência vazia e transbordante. O vampiro inveja o tempo, que não encerra e o homem, que sucumbe a uma curta passagem na terra. O limbo de partilhar dois mundos, os opostos, tudo e nada, sem experimentar nenhum plenamente. Melancólicos navegantes do tempo. Serão mito?
quinta-feira, 22 de novembro de 2007
CÃES "PERDIDOS" (JUST FOR LAUGHS)
Cães podem ser a coisa mais "lost" deste mundo. As fotos (acima e abaixo), apesar das fantasias variadas, têm algo em comum: a deliciosa expressão dos "fantasiados" (que certamente não pediram para sê-lo). Todos parecem estar pensando a mesma coisa: "Are you kidding me?". Como não dar risada? Pausa para um sorriso. Totalmente terapêutico:
terça-feira, 20 de novembro de 2007
STILL LIFE (?)
Definitivamente, não acredito que exista estagnação na vida - por mais que creiamos no contrário (até com motivos para isso). Do ponto de vista mais simplista (e óbvio) já estamos em movimento constante mesmo parados, mesmo dormindo, por que habitamos um planeta que gira em volta do sol e em volta de si mesmo, nossa nave espacial, flutuante, no universo sem fim. Não estamos parados. Ponto. Do ponto de vista mais subjetivo, podemos ter o otimismo diante daquilo que julgamos ruim e que "parece que nunca passará". Acreditar que as coisas melhoram, que tudo dá certo no final, apenas por querer acreditar. Do ponto de vista realista, basta observarmos, sem rigor, o nosso dia que acreditamos ser inerte, e vamos ter a reconfortante certeza de que, sim, não estamos estagnados, não estamos parados. Por que a cada novo segundo vivido somos outra pessoa e não estamos mais no mesmo lugar. As paisagens mudam com as horas e com elas as notícias, o aprendizado, a descoberta, as oportunidades. Viver é seguir uma trilha, não importa se estamos correndo ou imóveis, olhando para trás. Existir é encontrar um ritimo, como tudo na natureza; um equilíbrio. E, por fim, percebemos que não estamos bem caminhando numa estrada, mas subindo uma escada, degrau por degrau. Ok, algumas pessoas (por mérito ou sorte) conseguem subir mais rápido. Mas quem disse que temos um prazo, um tempo, para chegar a algum lugar? E, afinal de contas, que diabos é "chegar a algum lugar"? O lugar é nosso, só nosso, e só nós podemos saber onde ele está e o tempo que demora até chegar nele. O erro que cometemos, de certo modo como herança de pais e avós, é achar que existe um ritimo coletivo, como se todas as pessoas do mundo tivessem que dançar a mesma dança, com a mesma música, ao mesmo tempo. Como se a vida fosse um filme, monótono e repetitivo, nos dizendo que viver é abandonar etapas para abraçar outras, assumindo responsabilidades, ganhando dinheiro, criando filhos, até morrermos. Crescer, trabalhar, multiplicar e morrer. Francamente, eu acredito (quero acreditar) que não precisa ser assim. Quem inventou as regras? Melhor, quando nos puseram neste jogo, sem sequer sermos consultados? Saímos do útero para começar o "Jogo da Vida" e, quando menos percebemos, ele se transforma em "Banco Imobiliário" sob os nossos olhos. O caminho da felicidade possível é aquele que bem entendermos, ninguém precisa apontar, tampouco devemos nos sentir inferiores ou excluídos por seguirmos, por procurarmos, outras opções. O tempo é nosso, de cada um, para fazer dele o que quiser. Senhor e criado, na balança dos anos, precisamos enxergar que existimos para desempenhar a primeira opção. Não devemos nos culpar por não termos atingido (ainda) os degraus que outros já atingiram. Mas não devemos, com isso, nos acostumar com onde estamos pisando. Tudo é uma questão de tempo, coragem, fé, um pouco de sorte e vontade. O poder da vontade. É aí que nos superamos, onde nos separamos dos animais, onde somos mais humanos. Na vontade, na superação, na inteligência genuína que nos permite construir computadores e voar em foguetes à lua. A vida não é uma natureza parada, de quadro, de decisões e conseqüências imutáveis, imóveis. É um horizonte de possibilidades, de braços abertos, acolhendo calorosamente o nosso olhar de curiosidade. Seguir em frente, não importa onde, seguir em frente.
terça-feira, 13 de novembro de 2007
KAVÁFIS E OS 300
TERMÓPILAS
(Konstantinos Kaváfis)
Honra se deve àqueles que na vida
Termópilas fixaram para guardar,
que do seu dever nunca se desviam
que nunca fogem ao que o dever dita
e justos são na ação e sempre retos,
mas nunca perdem pena e compaixão;
se ricos, generosos, e se pobres
ainda generosos com seu pouco.
Que acodem sempre a todos quantos podem;
e, que à verdade sempre são fiéis,
mas não guardam rancor aos que são falsos.
E honra ainda mais lhes é devida,
se já prevêem (são tantos os que o fazem),
que no fim há‑de vir um Efiálte,
e os Persas no final hão‑de passar.
* * *
Afinal, por coragem (ou loucura) extremas, fizeram-se uma parede contra a invasão persa. E fizeram História. Pequena nota à respeito de "300", baseado nos quadrinhos de Frank Miller: primoroso.
segunda-feira, 12 de novembro de 2007
COMO MÁGICA
É preciso manter sempre o coração aberto e a alma jovem para que possamos enxergar os objetos mágicos que nos conduzem a tempos perdidos. Esses objetos encantados, muitas vezes, estão em lugares impensados. Outras tantas vezes escondidos em "não-lugares" até. E encontrando, deve-se agarrá-los com determinação e levá-los consigo. Eles garantem viagens paralelas, de sonho acordado, no trem que há muito ficou para trás. Como mágica.
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DOGS AND ANGELS
Há algo lindo, delicado e misterioso a respeito dos cães. Só quem os ama, verdadeiramente, entende a profundidade desta relação mágica que temos com esses encantadores animais que muito têm a nos ensinar sobre "sermos humanos". O final da leitura do livro "Marley & Eu" me trouxe risos e lágrimas. Não pelo lirismo, pela poesia, pela literatura. Mas pela pureza, a doçura, o amor verdadeiro, incondicional, ali descrito. É possível, é muito possível, amar um cachorro maluco, destruidor de objetos e mal-educado. Por que eles são mais do que isso. Eles são o fio que narra uma época em nossas vidas. Estão na terra para atravessar uma curta jornada que dura pouco mais de uma década e fazem de cada dia vivido a experiência apaixonada de nos esperar voltar, à noite. Nos despedirmos deles é uma tarefa impensável. É um pedaço que se desfaz, é o coração quebrado em mil pedaços. Dizer adeus ao cão que amamos é abandonar grande parte de nós mesmos em algum tempo perdido. Essa relação de amor, cumplicidade, fidelidade, é como se Deus nos permitisse comunicar com seus mais queridos anjos, enviados à Terra para nos fortificar a certeza que há um céu a ser vivido. Às vezes me pego observando um cachorro olhando para o alto. Eles não devem contemplar as estrelas à toa. Eles sentem saudade. E por isso tão cedo Deus os chama de volta. Por que é impossível viver longe deles.
SAUDADE
sexta-feira, 9 de novembro de 2007
"O ESTADO JARDIM"
Ainda estou tentando entender ONDE o filme "Garden State" (Hora de Voltar/2004) me pegou. Eu sei que me pegou, isso é certo; só estou tentando descobrir exatamente onde. É uma daquelas situações em que somos tocados por algo (ou empurrados, se for o caso; atropelados até) e demoramos em compreender o quê nos causou essa impressão. O filme é o trabalho de estréia de Zach Braff ("Scrubs") que, com muita sensibilidade (beirando brilhantismo), atua, escreve e dirige o filme (além de compilar a excelente trilha sonora). "Garden State" é como os americanos chamam o estado de Nova Jérsey, um lugar de retorno para o personagem principal, entrar em sintonia com seu passado, sua origem, seu pai, amigos. Uma pausa em sua vida sem sentido para ele compreender que viver plenamente é uma possibilidade (onde entra Natalie Portman, como a apaixonante Sam). É um filme delicado, flertando educadamente com a possibilidade de ser meio cult, meio indie, mas sem sonhar ser pretensioso, com cenas e momentos inusitados e tocantes. Uma "comédia dramática", como definem esse gênero tão especial de filmes. A vida, afinal, é absolutamente drama e comédia. A cena da piscina, em especial, é comovente. A reflexão inevitável sobre "onde está o nosso lar". Um filme que lembra infância, inocência, beijos roubados, aventuras anônimas, tardes com chuva. Uma história sobre tantas coisas que compõem a nossa vida, misturando descoberta, perdão, aprendizado e saudade numa tela colorida que ficamos por horas observando, sem saber se desejamos sorrir ou chorar. No fim das contas, uma pequenina história de amor, como uma fotografia querida, que guardamos para sempre dentro de um livro especial, para que ela nunca se perca e possamos encontrá-la um dia, acidentalmente, como a um tesouro. "Hora de Voltar" não é o filme mais genial de todos os tempos e, honestamente, tampouco quer sê-lo. Pode ficar na mesma prateleira de outros filmes emblemáticos, como "Sideways", "Brilho eterno de uma mente sem lembranças", "Encontros e Desencontros" e, principalmente, "Elizabethtown". Com este último, o filme possui uma silenciosa cumplicidade. Ao final tive múltiplas sensações. Além da vontade de conversar um pouco com o próprio Zach Braff, quase consegui enxergar Andrew, Drew, Samantha e Claire, conversando por horas, em algum parque, pouco antes de o sol nascer, refletindo sobre que rumos a vida toma, por mais estranhos que possam parecer. Por fim, acho que compreendo onde o filme "Garden State" me atingiu em cheio: na percepção de que não devo tanto refletir sobre a vida. Apenas vivê-la.
quinta-feira, 8 de novembro de 2007
O VÔO DE NIETZSCHE
"Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar, para atravessar o rio da vida. Ninguém, exceto tu, só tu. Existem, por certo, atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar. Onde leva? Não perguntes, segue-o."
*
FRIEDRICH NIETZSCHE (1844/1900). O maior de todos. Para mim, pelo menos. Um estrangeiro na terra, incompreendido (quase incompreensível). Pensamentos espalhados como paredes de um labirinto perfeitamente equilibrado na construção das suas idéias vanguadistas. Egomaníaco justificado, sabia que havia nascido séculos antes do tempo, e escrevia para as gerações por vir. Considerava-se o próprio Zaratustra, que saia da caverna para constatar que ninguém entendia as palavras que pendiam da sua boca. Um homem que gritava com sua voz quase inaudível. E, por pouco, não resolveu calar-se, voltar para a caverna e desistir da humanidade. Enfermeiro voluntário, choca-se com a brutalidade humana na guerra franco-prussiana. Estava tudo errado, fora de lugar. Ele possuia um projeto - não um planejamento - mas um projeto: o homem, o Estado, a civilização. Ocupou-se em rasgar as doutrinas e arrancar as máscaras. Apontou o dedo para a decadência. Erroneamente associado ao fenômeno hitlerista, foi acusado de ser a base filosófica da ideologia nazista (em parte por culpa da sua irmã). Nietzsche não podia ser o "filósofo do nazismo" por que ele não pertencia a ninguém, à nada, mas à sua própria verdade. A quem ele era. Defendia o fim de toda a escravidão moral, social. Está além do bem e do mal, não importa quais preconceitos sejam atribuídos ao seu legado. Como um dogma, pregava a si mesmo a impossibilidade da sua felicidade, mas não a transparência da sua existência ao declarar, "não pretendo ser feliz, mas verdadeiro". E o foi. Talvez mais do que todos os outros, sem nenhum pudor em ofender, em balançar as estruturas da sociedade. Um entre tantos homens espetaculares, que surgem na terra como se deslocados de uma outra dimensão e, no curto episódio das suas vidas, deixam um legado que atravessa o tempo. Ao ironizar que não "permitimos ao nosso Deus pecar", foi categórico, enigmático e execrado ao afirmar que o próprio "Deus está morto". Sua obra jamais. Resumia-se, com lirismo, ao dizer: "Quanto mais me elevo, menor eu pareço aos olhos de quem não sabe voar". Ele sabia voar.
quinta-feira, 1 de novembro de 2007
PACIÊNCIA (OU A FALTA DELA)
"Eu não tenho paciência", penso às vezes. Haverá um problema comigo ou o mundo (entenda-se as pessoas) ficaram mais intoleráveis? É impressão minha ou as pessoas realmente estão mais mal-educadas, individualistas e intragáveis? Está mais difícil a vida civilizada ou estou alucinando? Às vezes penso que deve haver algo com a minha percepção de mundo; talvez eu esteja me tornando rigoroso demais, intolerante demais, ficando meio "grumpy" antes do tempo. Em outros momentos, fico com a certeza de que as pessoas andam abusando da boa vontade mesmo, ficando mais folgadas e nos irritando com mais facilidade. Não estou me referindo, aqui, ao "mau humor" nosso, de direito legítimo. Não, isso é normal. Ora, quem não acorda, às vezes, com a pá virada, e fica irritado até com alguém no ônibus só pelo tom de voz que lhe parece insuportável? Ou a roupa, o cabelo, a cara de alguém te irrita por que você está de mau humor? Tem vontade de voar no pescoço de alguém que sequer trocou uma palavra? Isso é normal. Absolutamente normal. É uma questão de paciência, sabe? E acho que vamos perdendo ao longo do tempo. Hoje entendo, mais claramente, por que o Donald Duck foi sempre o meu personagem mais querido e idolatrado da Disney. Ok, eu adorava o Mickey também, mas nem por isso deixava de reconhecer que ele era meio enfadonho e bonzinho demais vez ou outra. Meio boring. O Pato Donald não quer nem saber! Ele até tenta, coitado, se esforça um pouco, mas não consegue, é mais forte que ele: Donald é impaciente com crianças (principalmente seus sobrinhos), quer bater em animais e objetos inanimados, não engole desaforo, tudo que fugir do seu entendimento o tira do sério, não disfarça, não quer agradar (ainda que tente às vezes), não é politicamente correto, não faz média. E principalmente não faz cerimônia na hora de decidir no braço a sua raiva. Os desenhos animados do Pato Donald são sempre os mais hilários de todos e choro de rir até hoje quando me pego vendo algum bom (o que ele, o Mickey e o Pateta são expulsos por não pagar aluguel é de rachar o bico). O Pato Donald é cranky, grumpy, mal humorado e pouco se importa se não está agradando. Ele, simplesmente, não tem paciência.
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