segunda-feira, 17 de outubro de 2011

O CONTO DE FADAS DE WOODY ALLEN

"Meia Noite em Paris" (Midnight in Paris) é um lindo, pequenino, conto de fadas de Woody Allen. Uma deliciosa pausa nas suas tradicionais discussões e devaneios neuróticos sobre a existência moderna. Um sopro, um refresco, um bálsamo, um tesouro. Este é um filme mágico e surreal. Literalmente.
Woody Allen flerta com Paris em seu novo filme

O protagonista, Gil (bem interpretado por Owen Wilson), um americano da Califórina, visita Paris com sua noiva, uma típica americana superficial vivida por Rachel Mcadams. O sonho de sua vida era ter vivido na Paris dos anos 20, quando ele poderia ter conhecido tantos artistas incríveis que viviam por lá na época. Sua mulher, porém, não dá a menor bola para esse devaneio e ele se vê debravando sozinho a cidade luz. Eis que, num belo dia (ou melhor, numa bela madrugada), ele se perde em uma de suas andanças. Senta numa escadaria e, quando ouve um relógio bater a meia-noite (como nos contos de fadas) surge um Peugeot antigo, com umas pessoas dentro que o convidam para passear. E ele aceita...
Gil e Adriana dançam e se apaixonam nesta incrível (e impossível) viagem no tempo

De repente, o carro para numa festa que, de fato, está acontecendo nos anos 20 e os anfitriões são Scott e Zelda Fitzgerald. A partir deste momento, acontece uma série de encontros impossíveis com Pablo Picasso, Salvador Dali, Matisse, Ernest Hemingway, Cole Porter e tantos outros. Então ele conhece uma mocinha charmosa, Adriana, que acabou de terminar um romance com Modigliani e os dois se envolvem rapidamente. E qual é o sonho dela? Ter vivido em Paris durante a Belle Époque. E, de repente, os dois se veem nesta época e conhecem os artistas que viviam na cidade, como Toulouse Lautrec.
Salvador Dali (vivido por Adrien Brody) é um dos encontros improváveis de Gil

Basicamente, a discussão do filme é "que antes era melhor", a nossa nostalgia, a inexplicável saudade de um tempo passado, que sequer viviemos, e que sempre é melhor que o nosso presente banal. E um evidente exercício auto-biográfico de Woody Allen que realiza, na tela do seu filme, algo que parece evidentemente um dos seus maiores sonhos. Este é um filme lindo, emocionante e inesquecível.

Um lindo filme, uma linda reflexão sobre a vida. Inesquecível.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

COMO SE MEDE UM ANO?

Rent é um dos mais importantes shows da história da Broadway (estréia em 1996). Obra de Jonathan Larson, conta a história de um grupo de amigos que vivem em New York nos anos 80 e trata dos temas em discussão naquela época, como a recessão, as drogas, a homossexualidade, a liberação sexual e a AIDS. Em 2005, o musical ganhou adaptação para o cinema sob a direção de Chris Columbus. É óbvio que o filme não é, nem de longe, tão bom quanto o musical. Mas vale - como "O Fantasma da Ópera" - para quem quer experimentar a magia e a comoção de uma história sobre uma geração especial e negligenciada como foi a dos anos 80. "525.600 minutos". Como se mede um ano? A resposta não poderia ser mais simples: com amor.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

ILUSTRANDO

Gretchen Kelly, "Soneca de Gato"

RETORNO

Fim de férias e retorno à atividade bloguística.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

A FORTALEZA

"Eu não queria te acordar. Mas eu realmente precisava te dizer uma coisa". 

* * *

O toque contínuo fez com que ele levantasse da cama num pulo, assustado. O coração na boca, o pulso disparado, aquela sensação desconfortável de ser acordado repentinamente. Atendeu o telefone e, por longos instantes, ouviu calado o que a voz do outro lado da linha tinha para dizer. Mexia a cabeça, na cadência de um metrônomo, como se algo ali não fizesse sentido. Ora concordava, ora coçava a cabeça intrigado. Sem dizer uma palavra, encerrou a ligação; um bip inconfundível denunciou o fim da ligação no telefone. Descansou o aparelho na cômoda ao lado da cama, pôs as mãos no rosto.

E chorou copiosamente.

* * *

Os dias começavam sempre da mesma forma. Três toques do despertador - uma agradável música de relaxamento - que o ajudavam a despertar como uma criança. Movimentos lentos, curtos e precisos enquanto navegava da cama ao banheiro, do banheiro à cozinha, da cozinha ao banho. No caminho, café forte, cereais, o noticiário local, breve observação de e-mails e um longo banho quente, destes que inundam o banheiro numa névoa quase mística. Sempre era assim.

No dia do seu aniversário, porém - justo aquela manhã - observou-se por mais tempo que o necessário no comprido espelho do quarto. Apalpou o rosto, mexendo sob os olhos, e passou o corpo em revista, descobrindo o óbvio: não estava nenhum dia mais jovem. O corpo, apesar de ainda ostentar um pouco das características de dias mais saudáveis e atléticos, já denunciava a flacidez que chega com a passagem dos anos. Sobras onde antes só havia ruas e avenidas de músculos bem definidos. Fios prateados onde só havia um mar de cabelos castanhos escuros, como avelã. Ossos que já começavam a doer. Exames recentes que exigiam um pouco mais de cuidado.

Decidiu que correria, todas as manhãs, a partir daquele dia.

Retirou um tênis do armário, tão novo que ainda portava a etiqueta de compra. Caro. Vestiu bermuda, camiseta, sacou um tocador de músicas digitais. E seguiu para a rua onde foi inundado pela aquela explosão de sensações que se tem quando se ganha a rua no começo de uma manhã: buzinas, sons, cheiros, pessoas, vento, barulhos desconexos como uma orquestra na qual cada músico tem um plano diferente a seguir.

E seguiu em frente. A passos largos, estimulados pela música que ressoava em seus ouvidos. Sentia-se bem, dono de si, dono do mundo. Os carros passavam correndo ao seu lado, na rua, enquanto ele desviava dos obstáculos móveis que vinham na direção contrária, carregando suas sacolas e caixas. Ele se sentia leve, como se flutuasse, enquanto cruzava pelos transeuntes anônimos na sua corrida.

Sentia o suor escorrendo pelo rosto, o cabelo molhado, pesado sobre a cabeça, os pés e joelhos doloridos após o território vencido. Mas ele sentia aquela embriaguez da endorfina o levar mais longe, mais adiante, além de mais obstáculos. Chegou ao pier, quase 15km distante da porta da sua casa, onde parou para contemplar o mar. A água quebrando lentamente nas pedras, as gaivotas, aquele cheiro salgado tomando o seu pulmão. Era um dia bonito, ensolarado em que ele decidiu viver melhor. Era o seu aniversário.

Decidiu correr de volta.

* * *

A sirene alta parecia não fazer muita diferença diante daquele mar de veículos engarrafados que até tentavam abrir caminho inultilmente. A ambulância conseguiu, com muito sacrifício, se desprender da rua engasgada e ganhar uma avenida mais aberta, onde era possível correr para salvar a vida do homem que havia sido encontrado desacordado em seu apartamento. Suspeita de infarto. Lá dentro, tentativas patéticas de reanimação. O homem não respondia. Mas o carro seguia o caminho frenético.

* * *

A música alta, em seus ouvidos, o deixou desatento. Ao cruzar uma rua, quase foi atropelado por uma ambulância que seguia em disparado, após vencer uma série de carros presos num congestionamento. Parou, recuperou o fôlego e viu o carro branco desaparecer numa esquina adiante. Alguém ali estava sendo socorrido. Sentiu aquela mistura confusa de compaixão e felicidade por não ser ele ali, à beira da morte. E seguiu seu caminho.

Não que estivesse numa crise de meia idade. Não necessariamente. Havia se divorciado recentemente, é verdade, e comprado um carro esportivo, feito uma tatuagem. Bom, talvez estivesse. Mas ele não era um destes homens comuns, de existências comuns. Ele era especial, sabia disso, porque enxergava a existência que há além das entrelinhas. Não era um homem medíocre. Só estava enfrentando a metade da jornada ao seu jeito: descobrindo que correria todas as manhãs para retardar o passo da outra metade adiante.

E estava feliz. Pleno. Limpo. Leve. Na madrugada passada decidiu fazer algo importante. Enfrentar o seu pai. Iria completar 50 anos na manhã seguinte e decidiu dizer ao seu pai tudo o que sempre quis, sem medo; tudo o que sempre esteve preso em seu peito. Uma confissão, uma distribuição de verdades sobre aquele homem que havia tiranizado a sua vida, de sua mãe e irmãos. Aquele gigante, o colosso de sua infância que aterrorizava as crianças com olhares, meias palavras e mãos pesadas. Aquele homem de quase 90 anos, doente, e que seria atacado sem misericórdia no ocaso de sua vida. Seu presente de despedida, o que ele levaria para o túmulo. Aquela tonelada de palavras engasgadas que nem a velhice não seria capaz de defendê-lo. E por horas disse ao seu pai tudo que sempre quis dizer. E desligou. Um corte seco, bruto, um ponto final.

"Eu não queria te acordar. Mas eu realmente precisava te dizer uma coisa".

Havia chegado ao fim aquele tempo de trevas. A fortaleza estava no chão.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

ILUSTRANDO

São Jorge, o antiquíssimo afresco nas cavernas da Capadócia (Turquia). Curioso que esta foto tenha chegado às minhas mãos hoje, primeiro dia de Setembro. Não tem jeito, Setembro tem sempre algo de especial.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

AMOR PLATÔNICO

Jessica Chastain. Repentino e arrebatador. Nunca havia ouvido falar desta ruiva de pele branca feito leite e olhar docemente melancólico até o, também arrebatador, "Árvore da Vida". Ariana (não podia ser diferente), há algo imediatamente hipnotizante a respeito de Jessica Chastain. Um magnetismo que as ruivas de Áries parecem ter, que nos atrai, como se fossem sereias, para o abismo ou para o paraíso. Irresistível. Paixão platônica à primeira vista.

EM ESTADO DE GRAÇA

"Tree of Life" (Árvore da Vida), novo filme de Terrence Malick é, como li numa excelente crítica, uma "experiência religiosa". É impossível descrevê-lo, como cinematografia. Este é um filme para ser sentido. É uma obra de sensações, de memórias, de lembranças e de saudades. Um convite discreto a reflexões tão absurdamente simples que se transformam magicamente em pensamos profundos, caóticos quase desconexos. Este é um filme de rara beleza. Melhor, é o filme mais lindo, mais tocante e mais comovente que vi em toda a minha vida.
A "Árvore da Vida" é uma experiência a ser sentida.
Brad Pitt, no papel de um pai austero nos anos 50 só da (mais) uma prova do seu talento como um dos mais importantes atores do nosso tempo. Ao seu lado, Jessica Chastain, que parece um anjo na tela, como a mãe dos três meninos que testemunhamos a infância. Num contraponto presente/passado, temos ainda Sean Penn, num lindo papel (silenciosíssimo) em que ele se pega relembrando essas doces memórias, a tanto tempo perdidas, de quando ele viveu em companhia de seus pais e irmãos. Cenas costuradas com uma maestria difícil de explicar, cenas que poderiam ser quadros, iluminadas como sonho e marcadas quase todo o tempo por música clássica. E, permeando tudo isso, reflexões sussurradas na tela, como um narrador em prece. Dúvidas, angústias, pensamentos perdidos sobre o amor, a raiva, a perda, a dor, a saudade, a existência de um Deus.
Brad Pitt, em mais uma prova inquestionável de talento que fazem dele um dos maiores atores do nosso tempo.

Não há nada, absolutamente nada como este filme. E talvez nunca haja. Parece pretensioso dizer isso, mas este não é um filme para todos. Longe disso, é um filme para quase ninguém. Um clube fechado, para pessoas que não temem pensar sobre a dor de existir. Um diálogo, logo no começo, nos propõe a pensar que a vida pode ser vivida por duas perspectivas: pela "natureza", que segue seu próprio rumo e desejo e pela "graça". Assim me deixou este tesouro de Terrence Malick: em estado de graça.

ILUSTRANDO

As impossíveis pinceladas do artista francês Francoise Nielly. Belo demais.


terça-feira, 16 de agosto de 2011

OS LADRÕES E O VERÃO INESQUECÍVEL

Num dia excepcionalmente quente e seco, eu e meus dois primos decidimos fazer uma aventura. Como um bando de foras-da-lei, amarramos nossas camisetas suadas e encardidas em torno da cabeça (mais como turbantes do que como máscaras de bandidos procurados) e fomos roubar picolés numa banca de jornais que vendia sorvetes perto da nossa quadra. Que sabíamos nós sobre a vida? Tínhamos todos não mais que 12 anos.

Chegando ao nosso destino, descobrimo-nos ambiciosos. De que serviam três sorvetes se podíamos roubar o freezer que ficava acomodado solitariamente ao lado da banca? Um breve parlamento de olhos foi mais do que suficiente. Juntamos nossas forças e arrastamos o pesado eletrodoméstico para o terreno atrás da casa do nosso avô, onde passávamos o verão.

Não havíamos notado, porém, que deixávamos não um simples rastro do crime, mas praticamente uma estrada aberta denunciando o nosso caminho delinquente como uma linha desenhada à mão. Uma trilha perfeita, ligando a banca de jornal à nossa casa. Mas que sabíamos nós? Estávamos cometendo um delito destinado aos destemidos.

Mal havíamos chegado em casa e o dono da banca - que havia nos seguido - já estava parado, como um colosso, observando o nosso crime com olhar inquisidor. Os três, meus primos e eu, viramos rapidamente, os sorvetes coloridos escorrendo pelos nossos dedos machucados pela tarefa de roubar sorvetes.

Uma poça furtacor se formava sob nossos pés, o grande freezer estacionado ao nosso lado, como um transatlântico. Eis que nosso avô surgiu na janela e se inteirou do acontecimento. Era um homem simples, de bom coração e poucas palavras. Naquele dia, ouvimos um sermão que ficaria na história e que até hoje é contado aos nossos filhos.

Diante do irremediável, nosso avô decidiu pagar pelos sorvetes e pelo freezer estragado, dando-nos como punição a obrigação de tomar cada um dos picolés ali contidos.

Foi aquele o melhor dia das nossas vidas.

PARA VER E OUVIR: SARA BAREILLES ("SONG FOR A SOLDIER")

domingo, 14 de agosto de 2011

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: OS PÁSSAROS

"Os Pássaros" (The Birds - 1963): um encontro casual num petshop inocente em São Francisco. Melanie, típica loira fatal, brinca ser uma vendedora de pássaros para Mitch, um estranho galanteador que finge cair na conversa. Ele vai embora e ela decide segui-lo, para dar um par de periquitos ao seu flerte misterioso. Isso resulta numa aventura a uma cidade costeira, onde um bando de pássaros misteriosamente começa a atacar a população. Clássico mistério de Hitchcock em que um grupo de pássaros se aglutinando sobre uma linha de eletricidade de repente se transforma numa imagem perturbadora.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

OS GATOS AFRICANOS


Trailer oficial de "African Cats", novo filme da DisneyNature. E uma das coisas mais lindas que vi ultimamente.

PARA VER E OUVIR: VEGA 4 ("LIFE IS BEAUTIFUL")

domingo, 7 de agosto de 2011

ILUSTRANDO

Joseph Minton - "Distância"

PARA VER E OUVIR: COLDPLAY ("STRAWBERRY SWING")

O ARTISTA E A ILHA

No topo do morro, ao centro da ilha onde vivia, ele contemplou as estrelas numa noite de muita inspiração. O mar dançava, sem pressa, sobre a areia, entoando aquela melodia antiga e hipnótica que estimula o corpo a dormir. Ali, sob as estrelas, aquecido diante de uma pequenina fogueira, ele terminou o poema mais bonito já escrito pelo homem. As palavras, costuradas com maestria, pareciam formar um portal para um tempo mágico, para onde era impossível ir sem encher os olhos de lágrimas. E, assim, com os olhos encharcados, ele encerrou seu poema. Incrédulo com tamanha beleza. Adormeceu.

A vida era calma, naquela ilha sem nome, onde ele dividia as horas entre plantas, pequenas correntes de água doce, mangas, cocos e pássaros multicoloridos. Nunca havia visto um vestígio de qualquer expressão humana, e na verdade, já nem lembrava como havia parado ali. O esqueleto de uma velha embarcação, semi-enterrada na areia, e que servia como sua morada, oferecia algumas pistas. As flâmulas rasgadas que haviam sobrevivido, presas ao mastro de madeira morta, despertavam alguma familiaridade em seus olhos enrugados de náufrago.

Ele também gostava de desenhar. Usava pedaços de carvão, seiva de árvores, barro e elaborava painéis espalhados pela ilha como um museu a céu aberto. Num dia qualquer, porém, teve uma revelação. E correu a passos frenéticos para o grande paredão, numa clareira, para conjurar sua obra-prima. Ele sabia que aquela pedra era especial e só poderia ser usada para a pintura mais linda já feita pelas mãos do homem. Com movimentos rápidos e precisos, teceu traços, linhas, formas. Vermelhos, amarelos, azuis, verdes. Como mágica, surgiam paisagens e personagens que fariam Michelângelo enrubescer de vergonha. Nada, absolutamente nada na criação artística humana, seria capaz de se igualar a tamanha beleza estampada na grande pedra que se projetava no canto leste da ilha, como um prédio. Absorto, quase em transe, ele contemplou por horas a sua obra-prima. Comovido com sua própria superação.

Suas mãos, habilidosas, o ajudavam a construir um futuro naquela ilha solitária. Fabricava ferramentas, tecidos, instrumentos de sobrevivência variados e que o ajudavam a passar o tempo. Assim ele também improvisou uma flauta pequenina, que dedilhava com natural habilidade, engatilhando melodias e sons que se misturavam aos sons da floresta como se desde sempre estivessem entre os segredos daquelas matas. Imitava os pássaros, o barulho do vento e do mar. E sentado sob a sombra das árvores criava canções que pareciam narrar, num idioma estrangeiro, os acontecimentos de sua vida. Até que, após tantos anos de prática, ele se pegou soprando uma equação de notas que pareciam sair daquela flauta improvisada como se fossem a voz de Deus. E, novamente com lágrimas nos olhos, ele se enamorava daquele som que tomava seus ouvidos com uma força que parecia entorpecê-lo. Era aquela, sem dúvida, a mais linda melodia já composta pelo homem.

Sua arte, por fim, era a grande motivação para vencer os dias. Supreender-se, continuamente, com o que suas mãos eram capazes de gerar. As mais lindas canções, poesias e pinturas, que faziam daquela ilha abandonada o reduto mais puro e valioso da arte humana.

Até que ele percebeu que nada, absolutamente nada, entre tudo o que havia feito existia. A não ser ali, a não ser para os seus olhos e ouvidos solitários. Aquela arte era sua, somente. Ninguém jamais saberia da existência.

Ele não suportou o peso daquela revelação. E então, do alto da grande pedra, no canto leste da ilha, ele saltou para o infinito, como um pássaro, despencando rapidamente como um fruto maduro, que cai sozinho na mata, sem a percepção de ninguém. Um fruto, portanto, que jamais terá caído.

Como aquela arte. Que jamais terá existido.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: REBECCA

"Rebecca, a mulher inesquecível" (Rebecca - 1940): um milionário encontra uma mulher submissa em Monte Carlo e se casa com ela como quem faz compras numa loja: escolhe e leva para casa. Misterioso, áspero, quase rude, ele leva a jovem para uma vida de princesa numa mansão na Inglaterra. Lá, porém, descobrimos que uma sombra misteriosa ronda cada cômodo e cada lembrança: Rebecca de Winters, a falecida esposa do milionário. A mulher inesquecível, um fantasma que parece estar vivo no imaginário dos empregados e do viúvo. Mas quem foi Rebecca? Porque ela é inesquecível? Mais um filme supreendente do mestre Hitchcock.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: STRANGERS ON A TRAIN

"Pacto Sinistro" (Strangers on a train - 1951): 2 homens se conhecem casualmente numa viagem de trem. A partir deste encontro, descobrem partilhar um problema: um deseja se livrar de sua ex-mulher problemática. O outro, de seu pai. Eis que surge uma ideia: e se os dois resolvessem o problema um do outro, assassinando a mulher o pai? Isso criaria o crime perfeito, sem suspeita. Mas rapidamente as coisas fogem do controle e o que parecia um fácil desenlace se transforma numa caótica corrida pela inocência. Não é o melhor filme de Hitchcock, sem dúvidas, mas merece estar em qualquer maratona.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: VERTIGO

"Um corpo que vai" (Vertigo - 1958): Homem luta contra um trauma que parece perseguú-lo como uma piada de mau gosto. Uma mulher misteriosa que vira a sua vida de ponta cabeça. Segredos, tramas, loucura, realidade, devaneio? Um filme surpreendente do primeiro ao último segundo. No Top 5 Hitchcock, sem esforço.

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: ROPE

"Festim Diabólico" (Rope - 1948): 2 homens (seriam amantes?) decidem matar um rapaz exemplar pelo puro prazer de experimentar o poder de um homem sobre a vida de outro. Melhor, decidem esconder o corpo no meio da sala, sob o disfarce de uma mesa de festa. Super-homens infalíveis. Um filme sem cortes, meio teatro, meio revelação. Moderno demais até para os dias de hoje. Obrigatório.

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: PSYCHO

"Psicose" (Psycho - 1960): Moça ambiciosa foge com o dinheiro do patrão, alheia ao perigo na esquina. Aterrorizante, supreendente e moderno. Impossível de refilmar. Um filme que brinca com a nossa cabeça o tempo todo; uma provocação constante e irresistível. Sinônimo de cinema.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

PARA VER E OUVIR: JOHN MAYER TRIO ("WHO DID YOU THINK I WAS")


Bill Murray vestido de Elvis apresentando o trio é too cool for school...

sábado, 23 de julho de 2011

ILUSTRANDO

Carybé - "Figuras na Praia"

O PRISIONEIRO

Naquele espaço delimitado, nem muito grande nem muito pequeno, ele circulava com passos curtos para que não fizesse mais barulho que o necessário. Fazia suas refeições e cumpria a agenda fisiológica com o cuidado minucioso para que não causasse transtornos mais do que o necessário. Deitado, sobre seu fino colchão, num tablado onde esticava os seus ossos, tentava refazer mentalmente todos os passos que o haviam levado até ali. Em vão. Já não lembrava mais. Aquela prisão era o que havia restado, de onde ele contemplava os sons e as cores do mundo, apertando o seu rosto enrugado por entre as grades. 

Gostava de ver as crianças em suas bicicletas, não muito longe dali; os animais errantes, os pássaros sobre os fios de eletricidade e um aroma distante de almoço caseiro sendo feito. Se fizesse um esforço, fechava os olhos e fingia estar em outro lugar. Às vezes simulava-se invisível, desenhado seu desaparecimento por entre as sombras daquele espaço apertado onde fabricava a sua sobrevivência diariamente. Sem incomodar, mais que o necessário. 

Elaborava rotinas simples que o ajudavam a esgotar as horas e debruçava-se, afoito, sobre uma estante de livros: o único (e raro) prazer que o fora permitido. Ele não tinha mais nada, absolutamente nada, a não ser aquelas roupas puídas que cobriam seu corpo, sapatos gastos, uma escova de dentes e um punhado de livros escorados uns sobre os outros, numa estante que ele fazia questão de deixar sempre limpa e organizada. Eram suas posses mais preciosas, seus portais secretos, suas ruas e avenidas que o transportavam para outros lugares onde ele se acreditava feliz. 

Mas mesmo esse privilégio era controlado, verificado e autorizado. Sem excessos, sem exageiros. Como se aqueles livros inofensivos - quase inúteis - fossem um pecado ou crime de estado que mereciam punição. Os livros eram um benefício supervisionado que, com alguma ajuda e artifícios infantis, podia ser contornado. Com alguma criatividade, ele conseguia intercambiar aquela sua moeda amarelada em troca de leituras mais frescas, mais novas, que o deliciavam por dias até que ele se visse mais uma vez relendo todos os livros novamente. 

Em dias mais felizes, conseguia simular sorrisos diante de um espelho envelhecido que quase não oferecia mais reflexo. Era onde acompanhava o seu inevitável envelhecimento. Em dias mais difíceis, escorava-se num canto, como uma criança, e derramava um punhado de lágrimas sinceras, soluçando em silêncio para não incomodar seu captor mais do que o necessário; o que nem sempre era possível e quando ele menos percebia, já estava sendo açoitado novamente. Sem entender ao certo o porquê. Os golpes em suas costas, deixando-o em carne viva, até ser devolvido à cela, onde se deitava com cuidado, estralando aquele corpo cansado, que rangia como uma porta. 

A exaustão era o seu remédio. Assim ele via o dia desaparecer sob suas pálpebras. Até que um raio raquítico de luz, que atravessava o quarto pela pequena janela acima da cama, avisava-o que era hora de começar tudo de novo. Já não sabia mais a contagem das horas e dos dias e, para não enlouquecer, monitorava a passagem do tempo pelo crescimento de suas unhas, barba e cabelo, cortados em caráter espartano. Semanalmente, de três em três dias, mensalmente. Não havia como fugir.

Mas... e se ele pedisse o divórcio?

domingo, 10 de julho de 2011

segunda-feira, 4 de julho de 2011

JANE FONDA E UM CORPINHO IRRESISTÍVEL

Jane Fonda, mais uma cat person, e sua siamesa. Um corpinho irresistível.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

O NÚMERO

Ela sempre tinha muitos lugares para ir, contatos a fazer, coisas a resolver. Equilibrava, como uma malabarista, uma agenda diária de banalidades e assuntos de vida ou morte. Era uma mulher ocupada demais. Ocupada demais para o seu casamento, seus filhos, para si mesma.

Numa terça-feira, seu marido ligou três vezes no seu celular. Precisava dizer algo que ela nunca tinha tempo suficiente para ouvir. "À noite nós falamos sobre isso", respondia no automático sem nem processar as palavras do outro lado da linha. 

Na quarta ligação, desligou sem atender. Na quinta, desligou o aparelho.

À noite, em casa, não encontrou seu marido, que havia sofrido um acidente de trânsito e morrido no caminho para o hospital. O choque da notícia a obrigou a visualizar um slide-show mental em sua mente; imagens rápidas, frenéticas; pulos de tempo e espaço que misturavam sorrisos inocentes, roupas de festa, areia de praia, cheiro de tinta e malas de viagem. Um resumo da vida. Daquela vida, já tão estrangeira, que nem parecia tão dela.

Conversou com agentes de trânsito, com médicos, agentes funerários e filhos. Resolveu pendências burocráticas, financeiras. Enterrou seu marido numa manhã ensolarada, com cara de feriado, em que dezenas de pessoas de rostos completamente desconhecidos suspiravam diante do caixão que descia lentamente aqueles longos sete palmos.

Recebeu pêsames, abraços e palavras de conforto sinceras e fabricadas. Despediu-se de todos e deixou filhos com avós porque "precisava ficar sozinha por algum tempo, para se recuperar". Mas isso não a impediu de resolver assuntos de trabalho na manhã seguinte. Sofreu, sim, aquela perda. Mas seguiu em frente supreendendo a si mesma. Não se julgava tão inabalável.

E se passaram dias, semanas, meses. Um tempo corrido, de novos malabarismos e afazeres inadiáveis.

Numa noite qualquer, porém, verificando mensagens e ligações antigas no seu celular, parou quase imobilizada diante de um número. Aquelas ligações insistentes. Aquele número na agenda do seu celular. Lá estava ele, aquele número para o qual ela nunca mais ligaria, nem receberia ligações. Aquele vestígio eletrônico que carregou sobre ela uma presença e uma ausência do tamanho do mundo.

Deu-se conta de que precisava apagá-lo. E deletou o número, num pranto silencioso e trêmulo. Quase incrédulo, um quase espanto, um quase transe. Como se uma sombra a estivesse engolindo. Um abismo sem fundo.

Foi quando, para o seu inexplicável desespero, ela percebeu que o seu marido estava morto.

domingo, 26 de junho de 2011

(ALGUMAS) RAZÕES DE EU AMAR IAN MCKELLEN

Não precisa dizer muito. Ele é o Gandalf E o Magneto. Ponto final.

terça-feira, 21 de junho de 2011

PARA VER E OUVIR: "GRAVITY" (JOHN MAYER - "WHERE THE LIGHT IS" LIVE)

ILUSTRANDO

"Vampira" - Joseph Minton

PARADOXO

O gato que se acha... um gato?

quinta-feira, 16 de junho de 2011

TESOURINHOS


Nova animação do "Simon's Cat".

sexta-feira, 10 de junho de 2011

ALICE E A GRAVIDADE

Desde criança, Alice nunca gostou muito da gravidade. Era uma menina estranha, todos sabiam, dada a abraçar árvores e a questionar o inquestionável. Não por acaso, dizia querer ser astronauta quando crescesse. Não como todas crianças dizem. Alice realmente não entendia a gravidade. Porque sentia, desde muito pequena, que seu corpo não era puxado para a terra, mas empurrado para longe dela. Alice não se sentia muito deste mundo, na verdade.

Por obrigação, pela necessidade de aceitar os fatos, Alice fingia respeitar a gravidade. Mas isso se limitava ao contexto escolar e a discussões em que era preciso aceitar o conceito de Newton para evitar ser considerada louca. Mas era só fingimento. A gravidade não servia para Alice. E, no fim das contas, ela pouco se importava que achassem que ela era louca. Até gostava disso.

O dia mais triste de toda a existência de Alice foi quando ela soube que seu pai havia morrido. "A gravidade é assim. Ela puxa os homens bons para ela", chorou em silêncio, com mais um de seus "pensamentos de Alice" que ninguém conseguia ou tentava compreender. "A gravidade procura os homens de bem, como uma sereia".

Naquele mesmo dia, porém, como todos os loucos eventos na vida de Alice, ela descobriu estar grávida. E se viu então dividida entre a gravidade e a gravidez. E concluiu, em mais um "raciocínio de Alice", que a primeira havia puxado seu pai e a segunda atraído o seu filho. E decidiu que o segundo teria o nome do primeiro. Como numa trégua.

Mas o armistício durou pouco e Alice se viu novamente em conflito com a gravidade. Teria seu filho no espaço, se fosse possível. Para que ela nunca o achasse e ele vivesse escondido, a salvo, como o príncipe pequenino de Saint-Exupéry. Isolado, tranquilo, senhor de seu planeta, longe da gravidade que só servia para separar Alice das pessoas que amava. Mas mesmo Alice sabia que isso não era possível. E ela se pegava sorrindo, saboreando seu devaneio inocente, com a mão descansada sobre a imensa barriga que surgia sob seu vestido, como um monte.

Mas a paz entre Alice a gravidade chegaria de forma inusitada. Num voo de Roma, indo para a casa de seus pais, Alice entrou em trabalho de parto, minutos antes de o avião pousar. Chorou radiante, aquele choro de grávida meio sem explicação, porque havia compreendido, então, que "logo ela, a gravidade, é quem iria apresentá-la a seu filho".

Sorriu, olhando nos olhos semi-cerrados de seu filho em seu colo. Ele dormia. E os dois estavam felizes.

Era uma manhã ensolarada, preguiçosa, aquela que se projetava dentro do quarto de hospital onde Alice e seu filho repousavam. Uma destas manhãs que parecem perdidas no tempo.

A manhã em que a Alice e a gravidade fizeram as pazes.

domingo, 5 de junho de 2011

POEMA ESQUISITO - ADÉLIA PRADO


Dói-me a cabeça aos trinta e nove anos.
Não é hábito. É rarissimamente que ela dói.
Ninguém tem culpa.
Meu pai, minha mãe descansaram seus fardos,
não existe mais o modo
de eles terem seus olhos sobre mim.
Mãe, ô mãe, ô pai, meu pai. Onde estão escondidos?
É dentro de mim que eles estão.
Não fiz mausoléu para eles, pus os dois no chão.
Nasceu lá, porque quis, um pé de saudade roxa
que abunda nos cemitérios.
Quem plantou foi o vento, a água da chuva.
Quem vai matar é o sol.
Passou finados não fui lá, aniversário também não.
Pra quê, se pra chorar qualquer lugar me cabe?
É de tanto lembrá-los que eu não vou.
Ôôôô pai
Ôôôô mãe
Dentro de mim eles respondem
tenazes e duros,
porque o zelo do espírito é sem meiguices:
Ôôôô fia.

ILUSTRANDO

Detalhe do gigantesco painel "A Coroação de Napoleão" (Le Sacre de Napoleon), de Jacque-Louis David 

O MENINO, O FANTASMA, A SOLIDÃO, OS GIGANTES

Trailer de lançamento da coleção em HD da Team Ico, com os clássicos do PS2 "Ico", a triste história de um menino abandonado que precisa salvar uma prisioneira de um castelo; e "Shadow of the colossus", a solitária jornada de um rapaz que, para salvar sua amada, lança-se destemidamente contra gigantes espalhados por uma vastidão de perigos e silêncios. Dois jogos inesquecíveis, que ganharam status de arte e romperam a barreira entre videogame e cultura. Uma prévia imperdível enquanto esperamos por "The Last Guardian", que encerra a trilogia em 2012.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

PARA VER E OUVIR: AIMEE MANN ("GUYS LIKE ME")


Apesar de não ter o "ver", vale e muito pelo "ouvir". Linda música de grandes implicações autobiográficas.

ATROPELAMENTO

Este final de semana fui atropelado, sem nenhuma sombra de compaixão, por "Old Boy", poderoso(íssimo) filme do sul coreano Chan-wook Park e estrelado por Min-sik Choi no papel do atormentado Oh Dae-Su. A história, aos meus olhos, é uma combinação de "V de Vingança" com "Réquiem para um sonho", só que mais visceral, mais orgânico, mais dolorido, mais... grego. É basicamente isso. "Old Boy" é uma Tragédia grega (com "T" maiúsculo mesmo), só que ambientada na Coréia do Sul. Com uma edição moderna (quase pop) e uma fabulosa direção e direção de arte, acompanhamos o trágico destino de Oh Dae-Su que, um belo dia, é sequestrado enquanto falava com sua filha ao telefone. Subitamente, ele acorda num cativeiro, onde é mantido preso (quase domesticado) por nada menos que 15 anos. O desejo de vingança começa a corroê-lo. "Quem eu ofendi?". "Quem poderia me querer tão mal". E entre os questionamentos e dúvidas, a certeza crescente de que ele fugirá daquela prisão para encontrar seus inimigos e fazê-los em pedaços e comer um a um. E isso é o que o motiva, diariamente, enquanto vê os anos passarem como num relógio confuso. Ao sair, consegue o apoio de uma sushi-girl chamada Mido, que o auxilia em rastrear seu captor. E ele o encontra, enfim, para descobrir a verdadeira punição e o real valor de uma vingança. É quando tudo, como ponteiros de um relógio, gira em direções variadas. 360 graus. E tomamos conhecimento do triste destino de Oh Dae-Su. Não haveria vítimas nem vilões, afinal? Quem são os reais prisioneiros e captores? Poético, arrasador, visceral. Um atropelamento em forma de filme. E absolutamente imperdível.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

quarta-feira, 18 de maio de 2011

AMOR PLATÔNICO

Kirsten Dunst, o mais belo par de olhos tristes do cinema. Virgem, suicida, vampira, princesa. Kirsten Dunst é a personificação da doce melancolia. Única e muitas, meio séria, meio desvairada, como uma criança capaz de pregar peças, aprisionada no corpo de uma mulher. Ou uma senhora, de alma muito antiga, aprisionada no corpo de uma mulher misteriosa. Magra, sinuosa, elegante, flutuante, meio gato. É difícil ignorar Kirsten Dunst. Ela rouba o olhar, como uma fotografia imaginária de Claire Colburn. Ela é meio drama, meio mágica, meio música, meio choro, meio riso sem graça. Meio gueixa ocidental. Vários papéis seus me marcaram profundamente e alimentaram mais esta paixão platônica.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

A MÁGICA POLAROID DE TARKOVSKI

O olhar mágico de Tarkovski através de sua polaroid.



UM FILME FLUTUANTE, VOADOR

Revi, recentemente, um filme como se fosse a primeira vez. Trata-se de "O Clã das Adagas Voadoras" (House of flying daggers), lindo e arrebatador filme do mestre Zhang Yimou, estrelado pela sempre eficientíssima Zhang Ziyi e o surpreendente Takeshi Kaneshiro. A trama é simples: assassinato e um punhado de surpresas cercam uma paixão fulminante que surge no calor da batalha. Jin (Kaneshiro) é um policial incumbido de escoltar Mei (Ziyi), uma assassina do famoso clã das Adagas Voadoras. Sua missão é descobrir o esconderijo do grupo e, enfim, subjugá-lo. No caminho, porém, nenhum dos dois antecipou o que poderia acontecer: eles se apaixonam perdidamente um pelo outro. E, assim, passamos a acompanhar os desdobramentos desta linda história de amor, cercada de perigos, lutas sangrentas e algumas surpresas e traições no caminho. Um filme mágico, delicado (íssimo), atemporal, flutuante. Uma fotografia completamente onírica, como se estívessemos sob o efeito de algum encanto. Imperdível e obrigatório para fãs de filmes como "Herói" e "O Tigre e o Dragão".

domingo, 8 de maio de 2011

AMOR PLATÔNICO

Zhang Ziyi. A minha primeira-dama de musas orientais. Guerreira, dançarina, fantasma. Zhang Ziyi não anda, flutua. Ela é de outro tempo. Melhor, ela é atemporal. Com seus traços delicados, tem um destes rostos que parecem desenhados, como um ideograma vermelho, perfeito, sobre um pavilhão de seda. Ela é meio vento, meio água, meio pássaro. Meio vidro, meio poeira, meio sombra. Como se pudesse ser levada embora por uma brisa mais forte, ou se romper em milhões de pedaços, como cristal. Ao mesmo tempo, comunica poder, vigor e grandeza, com movimentos contidos, precisos de assassina letal. E assim, Zhang Ziyi também é fogo, rocha, dragão. Uma paixão platônica do outro lado do mundo, do outro lado de uma grande muralha, de onde contemplo-a com grande distância e admiração. Como se a observasse da lua.

terça-feira, 3 de maio de 2011

LOS ANGELES, CIDADE PERMITIDA

Aguardando ansiosamente pelo lançamento do novo blockbuster da Rockstar: "LA NOIRE". A partir de 17 de maio, Los Angeles será minha cidade permitida.

ILUSTRANDO

Erich Heckel - Paisagem próxima a Dresden

segunda-feira, 2 de maio de 2011

FILMES QUE COMBINAM

Gattaca ("Gattaca", Andrew Niccol - 1997): Num futuro não muito distante, o mundo volta a ter ares dos anos 50 e os pais podem escolher cada detalhe genético dos seus filhos, antes de eles nascerem, evitando todo o tipo de imperfeição e criando, assim, seres humanos perfeitos. As crianças, concebidas naturalmente, são estigmatizadas como "filhos de Deus" ou "de-gene-rados" e perdem toda e qualquer chance de ascensão social. Ethan Hawke vive Vincent, um menino concebido de forma natural e que sonha em ser um piloto numa missão a Saturno. Mas sua miopia e problemas cardíacos o condenam como um "inválido". Para perseguir o seu sonho de infância, ele contrata os serviços de um comerciante do submundo que consegue falsas identidades genéticas que abrem as portas para a carreira espacial. Desde que ele seja responsável por hábitos espartanos de higiene e se mantenha à sombra, nada o impedirá de viajar. Mas um assassinato repentino põe tudo à perder quando um simples cílio o coloca imediatamente como suspeito. Gattaca é um filme sobre a luta desesperada contra a pré-determinação da vida. Ser obrigado a aceitar um destino imutável. Um filme sobre a dor de existir, sobre a imperfeição e o drama de enfrentar um sistema que decide, no berço, o futuro de uma criança.

Não me abandone jamais ("Never let me go", Mark Romanek - 2010): Se filmes pudessem ter almas gêmeas, Gattaca e Never let me go seriam um exemplo perfeito. Baseada em livro homônimo de Kazuo Ishiguro, a história narra a trajetória desesperada de 3 jovens que descobrem, muito cedo, um destino cruel: são clones e vivem para o único objetivo de gerarem órgãos saudáveis para os seus "originais". Seres humanos com prazo de validade, eles aguardam a concretização de suas missões, aceitando tristemente suas condições de existências inferiores. Um filme que grita e que chora; e que nos leva consigo durante cada segundo de sua projeção. Uma linda, comovente e aterrorizante história sobre a impossibilidade de se vencer o destino, o tempo e a vida - que passa para todos. Sem exceção.

Dois filmes que combinam.