quinta-feira, 7 de maio de 2015

A VIDA DEPOIS DE PIA


pouco mais de um ano, eu recebi uma notícia que mudaria a minha vida para sempre. Uma ligação, um punhado de palavras entrecortadas por suspiros de medo e dúvida; um acidente, uma surpresa.

"Eu não sei o que fazer", você me disse.

E eu me vi ali, com os ponteiros do meu relógio paralizados; a respiração suspensa, um silêncio de alguns segundos que pareciam horas, a história da minha vida correndo na velocidade da luz diante dos meus olhos. Frio na barriga, incerteza. Tudo havia mudado, nada mais seria como antes.

É que ser pai não fazia mais parte dos meus planos. Há muito, muito tempo. Uma decisão sem volta, escrita em pedra. "Não levo jeito para isso", decidi com os meus botões. E ninguém jamais me convenceria do contrário.

Você me esperou com olhos inchados naquela noite. A porta entreaberta, "pode entrar", sua barriga cheia de borboletas. Sem dizer muita coisa, ou por falta de saber o que dizer, ficamos ali abraçados. Ninguém ensina a gente o que fazer numa hora como essas. É o último e derradeiro suspiro da juventude escapando de uma vez por todas pelos nossos dedos.

Mas o saldo do caleidoscópio das nossas apreensões, com ar de criança que não sabe o que fazer, foi que seguiríamos em frente. Não havia outra opção, não é mesmo? 

E aqui estamos nós. O tal "Dia das Mães" que passa a significar tanto, tanto mais do que as propagandas na televisão, e aquela ligação banal de cinco minutos que nos damos o trabalho de fazer com um quê de culpa e obrigação.

Aqui estamos nós, sem tempo, sem dinheiro. Aqui estamos nós, exaustos, sem dormir por um século, nossa cumplicidade dividida como a xícara de café solitária, que tomamos juntos, a quatro mãos. Os cabelos desgrenhados, a mancha na minha camisa de trabalho, o caos de um apartamento inundado por fraldas, a necessidade de comprar uma cadeirinha para o carro.

Descobrir que nos tornamos pais.

Mas mais importe. Aqui está Pia, que chegou sem avisar, sem pedir permissão e revirou a nossa vida de pernas para o ar, para sempre. Uma outra mulher que caiu de para-quedas e a quem quero dar o meu mundo. 

E a vida não poderia ser mais mais linda, mais inédita, mais incrível. 

A nossa vida. Depois de Pia.

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