domingo, 10 de maio de 2015

A HISTÓRIA MAIS BONITA DO MUNDO


Uma das maiores preocupações da minha mãe era que eu não achasse ninguém. Que eu vivesse uma vida solitária, sem filhos, sem deixar nada; que eu passasse em branco. E eu me esforçava, sem muito sucesso, em tranquilizá-la.

"Conheci alguém, mãe", eu mentia, "mas não deu certo".

E via o seu sorriso se iluminar e murchar numa fração de segundos. "Não se preocupe tanto em achar a mulher certa, meu filho", ela me dizia. "Mas em ser o homem certo". E tocava o meu rosto com delicadeza, um sorriso doce, para me confortar.

A verdade é que eu nunca dei muita bola para isso. Mas queria dar a ela esta alegria. Nós dois sabíamos que ela não viveria muito mais tempo - todos aqueles estados avançados nos exames não deixavam muita esperança. 

Minha mãe optou morrer perto do mar. Exausta, as pernas já quase não a sustentavam em pé, pediu que eu a levasse para a beirada naquele último dia. E ficou ali, sentada, a água do mar quebrando gentilmente na praia, cobrindo o seu corpo até a cintura.

Ela sorria, pela primeira vez em tanto tempo, brincando com a areia úmida entre os seus dedos, reclinando a cabeça para trás, para absorver o sol. O cabelo ralo, sem cor, dançando no vento, e uma sensação de gratidão que parecia emanar dos seus poros.

"Obrigada, meu filho".

E eu fiquei ali, chorando em silêncio, sem saber que também estava dizendo adeus.

* * *

A minha mãe morreu sem me ver conquistar nada. Carreira, casamento, meus filhos. Ela foi embora deste mundo enquanto eu ainda era um jovem sem planos, cheio de ideias perdidas e rumo não definido. Ela foi embora apenas com as minhas promessas. 

Já são tantas décadas, mas é engraçado como o tempo passado não deixa o olho secar. E, nos meus devaneios mais sinceros, ainda consigo sentir o cheiro da maresia daquele último dia. E vejo a minha mãe, ali, frágil, sentada, acenando e sorrindo. 

Enxuguei os olhos, pus as fotografias de lado e me ajoelhei com os braços sobre a cama; decidi falar com Deus, como há tanto tempo eu não fazia. E fiz uma prece sincera, no apagar das luzes do quarto, para que ele me levasse num sonho para algum lugar onde a minha mãe estivesse, e que eu pudesse segurar na sua mão uma última vez e contar a ela sobre tudo. E vê-la sorrir, sem deixar seu sorriso murchar.

O vento mexia suavemente a cortina do quarto. Olhei para o lado, a minha mulher dormindo profundamente, a areia do sono começando a nublar as minhas ideias. Adormecendo.

Então um som de gaivotas, naquela sinfonia caótica e nostálgica.
E um barulho de mar, quebrando na praia, preguiçoso. 
Um vento forte, frio, invadindo a minha roupa, 
deixando os meus pensamentos salinos. 
A areia morna, sob os meus pés descalços. 

Eu estava na praia. Na manhã do dia em que a minha mãe se foi. Olhei para os lados, afoito, eu havia entendido tudo. A minha prece tinha sido atendida. Mas ela não estava em canto algum.

Até que eu vi uma menina, talvez com pouco mais de seis anos de idade, brincando na areia. Silenciosa, os olhos expressivos, gigantes; o cabelo escuro feito petróleo. As mãos pequeninas, delicadas, fazendo castelos mal planejados.

Foi então que ouvi alguém gritando um nome, e ela se virou. E eu entendi, no caleidoscópio esquizofrênico de pensamentos e sensações, que aquela menina, na areia, era a minha mãe. 

Sorri, numa mistura de riso alto e choro sincero. E caminhei lentamente até a direção dela. A minha sombra chamou a sua atenção quase que imediatamente, mas antes que ela pudesse esboçar qualquer reação, eu me antecipei:

"Você está fazendo castelos de areia?", perguntei.

Ela me olhou, um quê de surpresa, um quê de curiosidade. 

"Sim", sorriu, "mas eles não ficam de pé".

E então a água veio e cobriu seus castelos, transformando-os em nada, mais uma vez. Fazendo seu sorriso murchar.

Sentei na areia e começamos a fazer castelos juntos, empilhando a areia fofa, criando cidadelas imaginárias, com ruas, torres e jardins. Nossas mãos se misturando na areia, nossos risos abafados pelo barulho das ondas quebrando na praia. 

"Eu conheci uma mulher maravilhosa", disse, repentinamente.

Ela me olhou, sem entender muito bem.

"E vocês se casaram e tiveram muitos bebês?", ela perguntou.

"Sim", respondi, rindo e enxugando os olhos com mãos cheias de areia.

E ficamos ali, juntos, conversando e eu devo ter contado sobre tudo da minha vida para aquela menina que pouco compreendia, mas sorria, os olhos semi-cerrados sob a luz do sol, dizendo que eu era ainda pior que ela em fazer castelos de areia. 

Novamente chamaram o seu nome. Ela virou o rosto e se levantou, me abraçando por um longo tempo. E saiu correndo, parando no meio do caminho para acenar. E eu fiquei ali, com as mãos afundadas na areia, tomado por uma dose de perplexidade que parecia me engolir de dentro para fora. 

E a menina correu até desaparecer, diante dos meus olhos incrédulos.



Então o despertador me tirou dali, como quem é puxado da água. Abri os olhos, lá estava o meu quarto; a minha mulher já havia levantado como sempre fazia; os barulhos da cidade começando a invadir o quarto.

Levantei, ainda letárgico, depositando os pés sobre o assoalho frio. E, com as duas mãos sobre o rosto, devo ter ficado ali, pela eternidade de alguns minutos, saboreando os instantes daquele sonho que já começava a sumir diante dos meus pensamentos sóbrios.

* * *

Você pode não acreditar em nada disso que eu acabei de contar. E achar pretensioso da minha parte, até. Não te julgo. Mas esta é a história mais bonita do mundo.

Para mim ela é.

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