segunda-feira, 31 de dezembro de 2012
EM SUA COMPANHIA
Meus pensamentos também estão com Jorge hoje. Bem como o meu profundo desejo que ele continue me deixando andar em sua companhia no ano que chega.
PARA VER E OUVIR: DORIVAL CAYMMI ("O BEM DO MAR")
Tudo a ver com virada do ano. Coisa de mar, coisa de Bahia, coisa de Yemanjá.
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AO 12. E AO 13
Quando o 11 virou o 12 eu meditei para que o ano que se projetava no horizonte fosse um ano melhor. Eu precisava disso, como se fosse oxigênio. 2011 - em sua totalidade praticamente - havia sido feito de trevas, então o seguinte, supostamente, deveria ser feito de luz. E assim ele foi. Por boa parte dos seus dias, semanas e meses, pelo menos.
Mas, como num tabuleiro de xadrez - como assim é a vida -, o 12 também me trouxe sua [ampla] cota de trevas. Dias brancos e negros, alternando-se num balé de riso e tristezas, de perda e ganho. As alegrias foram plenas, absolutas. As trevas profundas, abissais, sob as quais eu afundei ao ponto de me afogar.
2012 foi luz e naufrágio.
Mas isso não me impediu de correr para a margem, para a praia, apoiando meu corpo [ainda mais] exausto na energia que sobrava, lutando por cada novo sopro de ar. Para sobreviver. Por alguma razão, pela necessidade de seguir em frente, de não sucumbir. Porque, como diz Camus, no meu pior inverno eu também descobri um verão invencível.
E é este o meu pensamento para o 13. Que ele seja meu número da sorte. E que brilhe, feito um farol, apontando um horizonte de beleza. E de paz.
Mas, como num tabuleiro de xadrez - como assim é a vida -, o 12 também me trouxe sua [ampla] cota de trevas. Dias brancos e negros, alternando-se num balé de riso e tristezas, de perda e ganho. As alegrias foram plenas, absolutas. As trevas profundas, abissais, sob as quais eu afundei ao ponto de me afogar.
2012 foi luz e naufrágio.
Mas isso não me impediu de correr para a margem, para a praia, apoiando meu corpo [ainda mais] exausto na energia que sobrava, lutando por cada novo sopro de ar. Para sobreviver. Por alguma razão, pela necessidade de seguir em frente, de não sucumbir. Porque, como diz Camus, no meu pior inverno eu também descobri um verão invencível.
E é este o meu pensamento para o 13. Que ele seja meu número da sorte. E que brilhe, feito um farol, apontando um horizonte de beleza. E de paz.
É apenas isso que peço a ele.
domingo, 30 de dezembro de 2012
BORBOLETAS
A maior riqueza do homem
é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.
Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas,
que puxa válvulas, que olha o relógio,
que compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc.
Perdoai
Mas eu preciso ser Outros.
Eu penso renovar o homem usando borboletas.
Manoel de Barros
é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.
Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas,
que puxa válvulas, que olha o relógio,
que compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc.
Perdoai
Mas eu preciso ser Outros.
Eu penso renovar o homem usando borboletas.
Manoel de Barros
sábado, 29 de dezembro de 2012
A MINHA ALMA NERD NÃO ME DEIXA ESCONDER...
...Connor é, simplesmente, o CARA. A Ubisoft fez mágica com "Assassins' Creed 3". É mais do mesmo mas, por alguma razão, é tudo novo. Uma experiência épica, antológica, na América do Norte revolucionária. Há um prazer sublime em assassinar os casacas vermelhas e ajudar a fundar o país que um dia viria a se tornar os Estados Unidos da América. E um herói índio, incrível como é Ratonhnhaké:ton (seu nome de batismo), trouxe vida de volta à série. Imperdível.
quinta-feira, 27 de dezembro de 2012
"A CADA CRIME, A CADA BOA AÇÃO...
...o futuro é reescrito". Essa frase ajuda a definir esse filme impossível de descrever. Do que fala "Cloud Atlas" (A Viagem)? Sobre amor? Liberdade? Sobre o fato de que nenhuma vida é um evento isolado e que todas as existências na terra, entre o passado, o presente e o futuro estão interligadas? Este filme [absurdamente belo e tocante] é sobre todas essas coisas. E muito mais. Fico tentando bolar uma forma de explicar o que faz esse filme tão mágico e tão especial - ou sobre como se desenrola a cadeia de eventos meticulosamente embaralhados na tela - mas confesso não conseguir... é uma experiência que precisa ser vivida.
As nossas vidas, as nossas escolhas, os nossos encontros. Histórias nunca terminadas
Esta é uma história sobre dezenas de personagens, da América escravocrata à Coréia do Sul futurista, passando pelos anos 70 e um futuro pós-apocalíptico. Personagens que se cruzam, se entrecruzam, e se revezam enquanto partilham juntos uma mesma linha do tempo. Mistérios, segredos, suspeitas. Os acontecimentos vão surgindo na tela e expondo questionamentos e reflexões - como um convite - cabendo a nós aceitá-los ou não.
"Este filme é uma viagem", uma grande maioria de pessoas dirá.
Sim, é. E que viagem...
quarta-feira, 26 de dezembro de 2012
segunda-feira, 24 de dezembro de 2012
domingo, 23 de dezembro de 2012
sábado, 22 de dezembro de 2012
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
RETROSPECTIVA NERD
Pelo menos do ponto de vista digital, 2012 foi sim um bom ano.
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quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
PENA
Uma dor lancinante nas costas o despertou do seu sono. Uma sensação desesperadora, como se suas clavículas estivessem sendo trituradas. Tocava-se, com aflição, em busca de algo; em busca daquela força que parecia destruir seu corpo por dentro.
Em vão.
Gritou, gemeu, chorou, enquanto se contorcia sobre a cama. Suando frio, embriagado pelo peso da sua respiração ofegante, correu para o espelho do banheiro. Olhava-se, curioso, tateando suas costas em busca de algum indício daquela dor terrível. Nada.
Então, de repente, a dor calou.
E ele seguiu para o seu dia. Como se nada tivesse acontecido. Talvez fossem gases, talvez tivesse dormido de mau jeito. Uma cãibra. Algo assim, não havia necessidade de se preocupar, nem de ir ao médico. A dor havia sumido.
E a vida seguiu o seu curso normal, aquela passagem de dias costurados por contas, filmes, refeições irrelevantes, encontros amorosos e livros nunca terminados. Até que, então, a dor voltou. E ele despertou, no meio da noite, como na primeira vez. Aquela onda, aquela pressão em suas costas, como se ele tivesse uma tonelada esmagando os seus ossos; como se o seu corpo fosse se romper de dentro para fora.
Virava-se, de um lado para outro, em busca de um ponto de paz, onde pudesse respirar aliviado mas a dor não passava. Levantou-se, acendeu a luz e ficou de pé, nu, incrédulo, diante da sua cama desfeita. Duas manchas vermelhas marcavam os lençóis, como duas moedas de sangue.
De volta ao banheiro, percebeu que havia dois cortes em suas costas. Tocou os ferimentos, doloridos e inflamados, e percebeu algo estranho, como um espinho rasgando cada machucado. Tocou, espremeu a pele, mas nada aconteceu. Foi quando notou que a dor havia passado, exatamente como na primeira vez.
Fingindo que nada estava acontecendo, tomou banho como fazia todos os dias, ignorando a sensação da água morna que ardia sobre as suas costas feridas. Enxugou-se com delicadeza, novamente fingindo não sentir a toalha raspando nos espinhos que rasgavam as suas costas. E tapou cada um dos cortes com esparadrapos. E seguiu, como sempre, para o seu dia.
Mas a dor voltou a visitá-lo. Primeiro ao retirar os esparadrapos ensopados de sangue. Feito dois ferimentos à bala. Jogou as ataduras no lixo e ficou contemplando por horas aquelas duas marcas vermelhas e a pele ao redor, já ganhando tons lilases, de trauma. Com rios azulados cruzando as suas costas.
Tocava-se, com lágrimas nos olhos.
"Meu Deus, o que está aconecendo comigo?".
Num rompante de fúria, destruiu os travesseiros sobre a cama com golpes de inconformação. A dor o havia levado à exaustão. E então deitou sobre dezenas de penas espalhadas sobre a cama, envolto numa névoa resultante dos travesseiros desfeitos.
Sentia pena de si.
Pena.
Mas então ele entendeu tudo.
Vestiu uma calça, a primeira que achou, e saiu de casa de peito nu e pés descalços, rápido como um maratonista. Em passadas largas, subiu ao mirante da cidade para contemplar o sol nascendo sobre o mar. E quando as primeiras linhas douradas começaram a se desenhar sobre as águas lá embaixo, ele soube que Deus o havia chamado.
"Estou aqui", disse, de olhos fechados, absorvendo a sensação morna que envolvia o seu rosto.
E então saltou ao abismo, sentindo a violência do vento lambendo o seu rosto enquanto o seu corpo se aproximava do solo rapidamente, como um suicida. Foi quando percebeu as suas clavículas se rompendo, e a pele rasgando feito papel, e o esplendor de um par de asas que se projetavam das suas costas. E soube naquele momento que podia movê-las como duas novas mãos.
E elas planavam, com graça, levando-o de volta para as nuvens.
"Eu sou um pássaro".
"Eu sou um anjo".
E desapareceu no horizonte amarelo que envolvia aquele dia qualquer.
NATAL
Um dia, num canto qualquer do deserto, nasceu o menino mais pobre do mundo. E nada mais foi igual depois disso. Depois dele. E cá estamos nós, como todos os anos, celebrando o seu nascimento. A chegada do menino anônimo, nascido sobre a palha, que transformou as nossas vidas para sempre. Penso nisso todos os anos. E me emociono como se pensasse sobre isso pela primeira vez.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2012
"ONLY I WILL REMAIN"
Litany against fear
(Frank Herbert)
"Não temerei.
O medo é o assassino da mente,
O medo é uma morte pequenina que leva à destruição.
Olharei o meu medo nos olhos,
Permitirei que ele passe
Por mim e através de mim.
E quando ele tiver passado,
Acompanharei o seu caminho.
E onde ele tiver ido,
Nada haverá.
Somente eu permanecerei."
(Frank Herbert)
"Não temerei.
O medo é o assassino da mente,
O medo é uma morte pequenina que leva à destruição.
Olharei o meu medo nos olhos,
Permitirei que ele passe
Por mim e através de mim.
E quando ele tiver passado,
Acompanharei o seu caminho.
E onde ele tiver ido,
Nada haverá.
Somente eu permanecerei."
terça-feira, 18 de dezembro de 2012
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
segunda-feira, 10 de dezembro de 2012
CONTANDO OS DIAS...
Para voltar à Terra Média...
"Far over the misty mountains cold
To dungeons deep and caverns old
We must away ere break of day
To seek the pale enchanted gold.
The dwarves of yore made mightly spells,
While hammers fell like ringing bells
In places deep, where dark things sleep,
In hollow halls beneath the fells.
For ancient king and elvish lord
There many a gleaming golden hoard
They shaped and wrought, and light they caught
To hide in gems on hilt of sward.
On silver necklaces they strung
The flowering stars, on crowns they hung
The dragon-fire, in twisted wire
They meshed the light of moon and sun.
Far over the misty mountains cold
To dungeouns deep and caverns old
We must away, ere break of day,
To claim our long-forgotten gold.
Goblets they carved there for themselves
And harps of gold; where no man delves
There lay they long, and many a song
Was sung unheard by men or elves.
The pines were roaring on the height,
(The pines were roaring on the height)
The winds were moaning in the night,
The fire was red, it flaming spread;
(The fire was red, it flaming spread)
The trees like torches blazed with light.
The bells were ringing in the dale
(The bells were ringing in the dale)
And men looked up with faces pale;
The dragon's ire more fierce than fire
(The dragon's ire more fierce than fire)
Laid low their towers and houses frail.
The mountain smoked beneath the moon;
(The mountain smoked beneath the moon)
The dwarves, they heard the tramp of doom.
They fled their hall to dying fall
(They fled their hall to dying fall)
Beneath his feet, beneath the moon.
Far over the misty mountains grim
To dungeons deep and caverns dim
We must away, ere break of day,
To win our harps and gold from him!
The pines were roaring on the height,
(The pines were roaring on the height)
The winds were moaning in the night,
The fire was red, it flaming spread;
(The fire was red, it flaming spread)
The trees like torches blazed with light.
The bells were ringing in the dale
(The bells were ringing in the dale)
And men looked up with faces pale;
The dragon's ire more fierce than fire
(The dragon's ire more fierce than fire)
Laid low their towers and houses frail"
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domingo, 9 de dezembro de 2012
sábado, 8 de dezembro de 2012
ALEMÃES E SOVIÉTICOS
Como aqueles que habitavam o começo de tudo, nós descobrimos juntos o fogo. Dançamos ao redor dele, banhamos os nossos corpos em seu calor e nos queimamos, como crianças inocentes sob o sol.
Mas também cedemos à sedução de transformar o fogo em pólvora e então em guerra. E nos banhamos na guerra, e no nosso sangue que, rubro em dois tons, transformou-se nas águas em que nadamos ora como almirantes, ora como náufragos. Sucumbimos à batalha naval. Desaprendemos a brincar. Deixamos de ser continentes, viramos ilhas. Viramos as Coréias.
E então veio o frio. O frio longo. O inverno sem fim. Perdemos a conta, a noção, esquecemos a direção da luz. Passamos a combater no escuro, amigo ou inimigo, pouco importava. O som da respiração ofegante guiando os golpes, o cansaço aproximando os corpos para que, juntos, aguentássemos o frio - nosso armistício pessoal.
Você e eu.
Bebemos vinho e veneno, brindamos, embriagamos olhos, corações, almas, para fugirmos dos pensamentos que pareciam cortar a carne, feito cicatriz. Nossas tatuagens. Rasgamos as cartas e os mapas, tornamo-nos sim, crianças perdidas, de uma vez por todas. Esbarrávamos os nossos corpos na multidão, como naquele filme, sem nos reconhecermos. Estranhos. Estranhos? Sim? Não. Sim? Não sabíamos. Seguíamos.
Uma eletricidade, neta do fogo antigo, era a linha por onde passávamos nossos recados cada vez mais rarefeitos, cada vez mais cifrados. Intraduzíveis. Nosso esquecimento. Nosso desaparecimento. Nosso testamento. Sons, verbo, soltos no vento, na sombra do vento, virando pó, virando astro, coisa celeste, sem começo nem fim. Somente meio.
Não porque desistimos, nós apreciadores do bom combate. Apenas esgotamos as forças dos nossos corpos novos de almas antigas. Como soviéticos e alemães na fronteira pós-armistício. Já nem sabíamos mais porque continuávamos a lutar.
Dissemos "adeus" tantas vezes que a sonoridade da palavra já nem remetia a algum significado. Buscávamos estradas, caminhos, mas onde estavam elas? Descobríamos becos e muros e montanhas. Sentados no chão, contemplávamos o cume, sem a menor ideia de como subir. Deitávamos no chão, sob o som das estrelas, sob a água da chuva que disfarçava o peso das nossas lágrimas. Chorávamos com um sorriso no rosto.
Você e eu.
Como chegamos até aqui? Não sabíamos dizer. Um espelho cheio de cortes, ou seriam os cortes em nós? Também não sabíamos dizer. Dois corações, que um dia foram um só, batendo de forma esquisita, como duas metades mal cortadas, buscando-se avidamente para voltar a bater como máquina. Mas não conseguíamos achar os encaixes. As pontas, dobras e eixos pareciam lisos, estragados com o tempo e, por mais que tentássemos, as duas metades não conseguiam bater juntas por mais de alguns poucos instantes.
Diante dos nossos olhos, víamos as metades despencando no chão, como torres implodidas. Aquelas duas metades tristes, como nós, sem já saber como se encaixarem. Como chegamos até aqui? Não sabíamos dizer. Buscávamos as nossas costas, para não precisarmos ouvir bocas e enxergar olhos, nem suas verdades que não queríamos aceitar.
Buscávamos as nossas costas, pois elas eram amigáveis à cena que montávamos, como duas crianças brincando de cinema. De príncipe e princesa, de dragões e fantasmas, de oceanos e castelos. Até a noite chegar. E precisarmos nos virar, nos encarar, e novamente dizer adeus. Encerrar a paz volúvel.
Dois punhos cerrados, duas palmas entrelaçadas, sem saber se queríamos a violência dos nossos atos ou o carinho das nossas ideias.
Você e eu. Como alemães e soviéticos, na reinvenção das nossas fronteiras, na assinatura dos tratados, na construção dos muros. Na declaração de vitória e derrota. Sem falarmos mais uma palavra de um idioma comum, gritando em línguas estranhas as nossas ameaças infundadas de quem esqueceu a paz dos homens. Desesperados por voltar ao lar. Algum lar. Fosse ele qual fosse.
Gastando as últimas balas. O tic tac do rifle gasto pela ação, estourando os nossos ouvidos como um relógio acelerado. Tic. Tic. Tic. Balas esgotadas, baionetas e bandeiras ao chão, olhos vendados, macas e muletas.
O que restou de nós? O que permanece de pé ao nosso redor? Nossas catedrais e palácios reduzidos a colunas que parecem chorar seus detritos no horizonte. Nossos monumentos e avenidas, perfurados pelo peso das nossas bombas. Nossos museus e amantes escondidos, desolados.
Caminhamos incrédulos as ruas por onde andamos felizes um dia, sem reconhecê-las. Já nem lembramos mais onde está a porta de casa. Não conhecemos rosto algum que nos dê direções. Como alemães e soviéticos que só sabem o ofício da guerra, virando fotografia, virando vento, virando tempo, virando nada.
OS VENTOS ÀS FLÂMULAS DA MINHA VIDA
Se me esqueceres
(tradução do original em inglês)
Pablo Neruda
Espero que saibas
uma coisa.
Assim é:
Caso eu olhe
a lua cristalina, o ramo vermelho
do outono preguiçoso à minha janela,
Caso eu toque
o fogo,
a cinza intocável
ou o corpo retorcido do tronco,
tudo me leva a você,
como se tudo que existe,
cheiros, luzes, metais,
fossem pequenos navios
que navegam
rumo aquelas ilhas suas que esperam por mim.
Bom, agora,
Caso você deixe de me amar, pouco a pouco,
Eu também assim deixarei de te amar.
Se subitamente
você me esquecer,
não me procures
pois eu também já terei te esquecido.
Se pensares exaustivamente, à loucura,
os ventos às flâmulas
que correram pela minha vida,
e você decidir
me deixar à costa
do coração onde me enraízo,
lembre-se
que neste dia,
nesta hora,
eu erguerei meus braços
e as minhas raízes se levantarão
rumo a outro território.
Mas
se a cada dia,
a cada hora,
você sentir que estás destinada a mim
com doçura implacável,
se cada dia uma flor
subir aos seus lábios em minha busca,
ah, amor meu,
em mim todo o fogo é repetido,
em mim nada é apagado ou esquecido,
meu amor alimenta-se em seu amor, amada,
e enquanto você viver ele habitará seus braços
sem abandonar os meus.
(tradução do original em inglês)
Pablo Neruda
Espero que saibas
uma coisa.
Assim é:
Caso eu olhe
a lua cristalina, o ramo vermelho
do outono preguiçoso à minha janela,
Caso eu toque
o fogo,
a cinza intocável
ou o corpo retorcido do tronco,
tudo me leva a você,
como se tudo que existe,
cheiros, luzes, metais,
fossem pequenos navios
que navegam
rumo aquelas ilhas suas que esperam por mim.
Bom, agora,
Caso você deixe de me amar, pouco a pouco,
Eu também assim deixarei de te amar.
Se subitamente
você me esquecer,
não me procures
pois eu também já terei te esquecido.
Se pensares exaustivamente, à loucura,
os ventos às flâmulas
que correram pela minha vida,
e você decidir
me deixar à costa
do coração onde me enraízo,
lembre-se
que neste dia,
nesta hora,
eu erguerei meus braços
e as minhas raízes se levantarão
rumo a outro território.
Mas
se a cada dia,
a cada hora,
você sentir que estás destinada a mim
com doçura implacável,
se cada dia uma flor
subir aos seus lábios em minha busca,
ah, amor meu,
em mim todo o fogo é repetido,
em mim nada é apagado ou esquecido,
meu amor alimenta-se em seu amor, amada,
e enquanto você viver ele habitará seus braços
sem abandonar os meus.
sexta-feira, 7 de dezembro de 2012
quinta-feira, 6 de dezembro de 2012
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
EM NOME DO MEU MUTANTE AMOR PROCLAMO A PUREZA
LXXVIII
Pablo Neruda
Não tenho nunca mais, não tenho sempre. Na areia
a vitória deixou seus pés perdidos.
Sou um pobre homem disposto a amar seus semelhantes.
Não sei quem és. Te amo. Não dou, não vendo espinhos.
Alguém saberá talvez que não teci coroas
sangrentas, que combati o engano,
e que em verdade enchi a preamar de minha alma.
Eu paguei a vileza com pombas.
Eu não tenho jamais porque distinto
fui, sou, serei. E em nome
de meu mutante amor proclamo a pureza.
A morte é só pedra do esquecimento.
Te amo, beijo em tua boca a alegria.
Tragamos lenha. Faremos fogo na montanha.
Pablo Neruda
Não tenho nunca mais, não tenho sempre. Na areia
a vitória deixou seus pés perdidos.
Sou um pobre homem disposto a amar seus semelhantes.
Não sei quem és. Te amo. Não dou, não vendo espinhos.
Alguém saberá talvez que não teci coroas
sangrentas, que combati o engano,
e que em verdade enchi a preamar de minha alma.
Eu paguei a vileza com pombas.
Eu não tenho jamais porque distinto
fui, sou, serei. E em nome
de meu mutante amor proclamo a pureza.
A morte é só pedra do esquecimento.
Te amo, beijo em tua boca a alegria.
Tragamos lenha. Faremos fogo na montanha.
1979
Trilha apropriada para hoje. Em lembrança do ano de fabricação.
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quinta-feira, 29 de novembro de 2012
EVERY LEAF
"Ajudem-se.
Amem a todos.
Cada folha.
Cada raio de luz.
Perdoem".
Amem a todos.
Cada folha.
Cada raio de luz.
Perdoem".
"Árvore da Vida" (Tree of Life"). Nada menos que obra-prima.
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O SONHO
Ele acordou mais cedo que o de costume. Sentou-se de forma preguiçosa à janela, observando a chuva que caia igualmente preguiçosa lá fora, lavando as paredes do prédio, fazendo poças na calçada onde algumas crianças começavam a brincar.
Pêlos do seu braço arrepiados no compasso do seu coração e do café que fumegava em suas mãos, boca e garganta. É que ele pensava nela.
"Por favor, não me faça tão feliz", aqueles olhos eloquentes, aquelas bocas sem espaço para despedidas. Ele pensava. "Por favor, não me faça tão feliz".
Caminhou descalço para o quarto, os pés gelados sobre o assoalho. Aquele barulho gris ao seu redor, aquela chuva, aquela manhã emocionada. Aquela tempestade que abraçava o seu apartamento com algo de dor, algo de violência, algo adequado.
Algo.
Sentou sobre a cama, aquele misto de ansiedade e frio na barriga, como quem espera por um primeiro beijo. Abriu a caixa de fotografias com delicadeza. Memórias que já não se costuravam com tanta força. Ele já não sabia a cadência correta daqueles eventos, a cronologia, o que vinha antes, o que vinha depois. Cabelos mais curtos e mais compridos. Roupas, modas, cidades. Risos, beijos, restaurantes. Animais e monumentos. Ele e ela. Aquele passado breve. Aquele tempo sem fim.
Aquele tempo sem volta.
"Por favor, por favor, não me faça tão feliz".
Remexia as fotos entre os dedos, como cartas de baralho. Sorria. Espalhava-as sobre a cama desfeita como tarô. Aquele vento, aquela maresia, aquelas flores, de repente o quarto ganhava sensações salinas e de floresta, de calor e de frio. É que ele pensava nela.
Quando ele pensava nela. Como pensava.
Pêlos do seu braço arrepiados no compasso do seu coração e do café que fumegava em suas mãos, boca e garganta. É que ele pensava nela.
"Por favor, não me faça tão feliz", aqueles olhos eloquentes, aquelas bocas sem espaço para despedidas. Ele pensava. "Por favor, não me faça tão feliz".
Caminhou descalço para o quarto, os pés gelados sobre o assoalho. Aquele barulho gris ao seu redor, aquela chuva, aquela manhã emocionada. Aquela tempestade que abraçava o seu apartamento com algo de dor, algo de violência, algo adequado.
Algo.
Sentou sobre a cama, aquele misto de ansiedade e frio na barriga, como quem espera por um primeiro beijo. Abriu a caixa de fotografias com delicadeza. Memórias que já não se costuravam com tanta força. Ele já não sabia a cadência correta daqueles eventos, a cronologia, o que vinha antes, o que vinha depois. Cabelos mais curtos e mais compridos. Roupas, modas, cidades. Risos, beijos, restaurantes. Animais e monumentos. Ele e ela. Aquele passado breve. Aquele tempo sem fim.
Aquele tempo sem volta.
"Por favor, por favor, não me faça tão feliz".
Remexia as fotos entre os dedos, como cartas de baralho. Sorria. Espalhava-as sobre a cama desfeita como tarô. Aquele vento, aquela maresia, aquelas flores, de repente o quarto ganhava sensações salinas e de floresta, de calor e de frio. É que ele pensava nela.
Quando ele pensava nela. Como pensava.
Gotas tímidas despencavam dos cantos de olhos e janelas. Uma a uma, compondo manchas pequeninas, algo de pintura abstrata. Caindo, em sequência, um bombardeio melancólico de quem viaja ao passado. Ao passado bom. Tocava com as pontas dos dedos o seu corpo, aquela saudade, aquele vazio, aquela ausência, aquela distância, aquela escolha.
Já não se lembrava ao certo como tudo aquilo havia começado ou os eventos que culminaram no fim. Lembrava do meio. Da essência, do melhor. Da antecipação. Havia um cheiro, um sabor, um gosto de suor e saliva que ele ainda conseguia resgatar em algum canto não esquecido de sua língua. Conseguia sentir a sua pele, seus contornos, suas reentrâncias, ela estava ali, naquele emaranhado de lençóis solitários. Ela ainda estava ali, em algum canto.
Estaria sempre.
Recolheu as fotos, os ingressos de cinema, os cartões amassados, aqueles fragmentos de lembranças, aquela história contada como um caleidoscópio de vinho e veneno. Depositou tudo na caixa, como quem arruma um brinquedo. E guardou-a de volta no armário, entre agasalhos e sapatos, onde ela sempre ficava. O vento gelado que costurava uma trajetória entre a rua e o seu rosto o fez buscar um casaco para aquecer o seu corpo.
"Porque eu não saberia como viver sem você".
E seguiu para o começo de mais um dia, fechando a porta atrás de si de olhos fechados.
Já não se lembrava ao certo como tudo aquilo havia começado ou os eventos que culminaram no fim. Lembrava do meio. Da essência, do melhor. Da antecipação. Havia um cheiro, um sabor, um gosto de suor e saliva que ele ainda conseguia resgatar em algum canto não esquecido de sua língua. Conseguia sentir a sua pele, seus contornos, suas reentrâncias, ela estava ali, naquele emaranhado de lençóis solitários. Ela ainda estava ali, em algum canto.
Estaria sempre.
Recolheu as fotos, os ingressos de cinema, os cartões amassados, aqueles fragmentos de lembranças, aquela história contada como um caleidoscópio de vinho e veneno. Depositou tudo na caixa, como quem arruma um brinquedo. E guardou-a de volta no armário, entre agasalhos e sapatos, onde ela sempre ficava. O vento gelado que costurava uma trajetória entre a rua e o seu rosto o fez buscar um casaco para aquecer o seu corpo.
"Porque eu não saberia como viver sem você".
E seguiu para o começo de mais um dia, fechando a porta atrás de si de olhos fechados.
Um suspiro, uma prece, um sorriso.
E se fez acreditar, como sempre fazia, que tudo aquilo havia sido apenas um sonho.
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
"JEITOS ESTÚPIDOS DE MORRER"
Campanha publicitária (genial) da Companhia Australiana de Trens para estimular a prudência nas estações.
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
"DESTE PLANALTO CENTRAL...
..., desta solidão que em breve se transformará no cérebro das mais altas decisões nacionais, lanço os olhos mais uma vez sobre o amanhã do meu país e antevejo esta alvorada, com fé inquebrantável e uma confiança sem limites no seu grande destino...". (Juscelino Kubitschek).
Que saudade desta alvorada, que saudade desta solidão, que saudade de Brasília.
quinta-feira, 15 de novembro de 2012
quarta-feira, 14 de novembro de 2012
AL COYOTE
AL COYOTE
Jorge Luis Borges
Durante siglos la infinita arena
De los muchos desiertos ha sufrido
Tus pasos numerosos y tu aullido
De gris chacal o de insaciada hiena.
Durante siglos? Miento. Esta furtiva
Substancia, el tiempo, no te alcanza, lobo;
Tuyo es el puro ser, tuyo el arrobo,
Nuestra, la torpe vida sucesiva.
Fuiste un ladrido casi imaginario
En el confín de arena de Arizona
Donde todo es confín, donde se encona
Tu perdido ladrido solitario.
Símbolo de una noche que fue mía,
Sea tu vago espejo esta elegía.
Jorge Luis Borges
Durante siglos la infinita arena
De los muchos desiertos ha sufrido
Tus pasos numerosos y tu aullido
De gris chacal o de insaciada hiena.
Durante siglos? Miento. Esta furtiva
Substancia, el tiempo, no te alcanza, lobo;
Tuyo es el puro ser, tuyo el arrobo,
Nuestra, la torpe vida sucesiva.
Fuiste un ladrido casi imaginario
En el confín de arena de Arizona
Donde todo es confín, donde se encona
Tu perdido ladrido solitario.
Símbolo de una noche que fue mía,
Sea tu vago espejo esta elegía.
terça-feira, 13 de novembro de 2012
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
domingo, 11 de novembro de 2012
sábado, 10 de novembro de 2012
sexta-feira, 9 de novembro de 2012
quinta-feira, 8 de novembro de 2012
QUE HAJA COMÉRCIO ENTRE NÓS
A PACT
Ezra Pound
I make a pact with you, Walt Whitman --
I have detested you long enough.
I come to you as a grown child
Who has had a pig-headed father;
I am old enough now to make friends.
It was you that broke the new wood,
Now is a time for carving.
We have one sap and one root --
Let there be commerce between us.
Ezra Pound
I make a pact with you, Walt Whitman --
I have detested you long enough.
I come to you as a grown child
Who has had a pig-headed father;
I am old enough now to make friends.
It was you that broke the new wood,
Now is a time for carving.
We have one sap and one root --
Let there be commerce between us.
quarta-feira, 7 de novembro de 2012
terça-feira, 6 de novembro de 2012
segunda-feira, 5 de novembro de 2012
domingo, 4 de novembro de 2012
sábado, 3 de novembro de 2012
sexta-feira, 2 de novembro de 2012
E SE O SEU PIOR INIMIGO... FOSSE VOCÊ MESMO?
Difícil tentar explicar "Looper" (Assassinos do Futuro). É melhor assistir, é melhor que cada um tenha suas próprias ideias e interpretações. Há muito aqui, acredite, muito. Há algo de noir, algo de Blade Runner, algo de Gattaca. Estrelam Bruce Willis, Joseph Gordon-Levitt e Emily Blunt, com roteiro e direção de Rian Johnson.
Um futuro negro aguarda a humanidade, no ano de 2074, quando a máfia esconde os seus assassinatos ao enviar os corpos ao passado para serem dispensados. Aí entram os "Loopers", profissionais no "presente" que aguardam a chegada destas vítimas, para matá-las e sumir com seus rastros - afinal, elas não existem ainda. Mas, num belo dia, a própria versão mais velha do assassino vem para ser assassinada por sua versão mais jovem e mais, decide mudar o passado e reescrever o futuro numa intrincada história de vingança.
Joseph Gordon-Levitt (numa maquiagem perfeita, para deixá-lo mais parecido com sua verão mais velha, Bruce Willis) vive Joe, um matador de aluguel do passado - um "looper"
O que esperar deste encontro metafísico (e real) em que a mesma pessoa é caça e caçador? Como se desenrolaria a teia de eventos futuros, já que tudo está completamente embaralhado? Quem está certo? Quem é o vilão e quem é a vítima? Um paradigma absurdo, que chega a doer na cabeça. Um filme intenso, um roteiro fenomenal, uma história que merece ser vista. Simplesmente imperdível.
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
segunda-feira, 29 de outubro de 2012
sexta-feira, 26 de outubro de 2012
quinta-feira, 25 de outubro de 2012
O VERÃO DE 89
Quando eu, meus irmãos, primos e os outros meninos da rua nos encontramos, ainda hoje, é impossível não lembrar do verão de 89. Aquela lembrança sofrida, que parece beliscar algum canto da alma, quando nos esbarramos nos supermercados.
Não pelos bonecos ou desenhos animados; pelas músicas, roupas questionáveis ou pelas brincadeiras. Pelos filmes de aventura no cinema ou os lanches da tarde. Nem pelos banhos de piscina, as partidas de futebol ou os primeiros beijos que roubávamos das meninas naquelas brincadeiras de um tempo inocente que parecia durar para sempre. Um tempo que nunca passaria.
Não pelos bonecos ou desenhos animados; pelas músicas, roupas questionáveis ou pelas brincadeiras. Pelos filmes de aventura no cinema ou os lanches da tarde. Nem pelos banhos de piscina, as partidas de futebol ou os primeiros beijos que roubávamos das meninas naquelas brincadeiras de um tempo inocente que parecia durar para sempre. Um tempo que nunca passaria.
Não. É de Sabrina que lembramos. Aquela menina linda, aquela menina sem mãe, aquela menina flutuante, silenciosa, frágil, de olhos abissais e voz de feitiço. Sabrina, com seu cheiro de limão e canela. Sabrina, por quem cada um de nós foi perdidamente apaixonado.
De todas as meninas, Sabrina era a única que brincava com a gente. A única que não se importava de estar cercada por meninos. Ela era nossa, no sentido mais lindo e puro da palavra. Nossa amiga, nossa estrela da sorte. Sabrina, que queria ser astronauta ou rainha de um reino distante. Sabrina, que até hoje habita os meus sonhos.
Ela vivia com o seu pai. Sua mãe os havia abandonado quando Sabrina nasceu. Sem irmãos, sem avós, sem qualquer sombra de família que não aquele homem que odiávamos com toda a energia que habitava os nossos corpos imberbes. Aquele homem de olhos vermelhos e odor forte. Aquele cheiro de cigarro e bebida. Aquela barba azulada, como a de um pirata. Aquela voz rouca, baixa, assustadora que ainda consigo ouvir. Aquele homem cuja presença na janela era o suficiente para que Sabrina nos deixasse e voltasse para casa. Ela desaparecia à sombra do seu pai. Nosso inimigo mortal, jurado.
Naturalmente, não tínhamos capacidade de entender a dimensão do que acontecia com Sabrina. Hoje em dia, após a maturidade nos ter versado na capacidade humana para o bem e para o mal, sabemos que Sabrina foi, em verdade, uma prisioneira. E me corta a alma, ainda hoje, pensar se poderíamos ter feito algo. Se aquele verão poderia ter sido diferente.
Se poderíamos ter salvado Sabrina.
Se poderíamos ter salvado Sabrina.
Ela vinha brincar com a gente e fazíamos um esforço para ignorar as marcas no seu corpo, os arranhões. Sabrina tropeçava demais, assim nos explicava, com aquele seu sorriso tímido que nos desarmava.
"Foi o vento que me derrubou no chão e quebrou o meu braço", ela nos dizia.
"Não, eu sei que não foi o vento", eu ainda digo para mim quando vejo meu reflexo grisalho no espelho. Quase todos os dias, como uma oração. "Por Deus, eu sei que não foi o vento".
Ela sorria, puxava-nos pelo braço, e ganhava a dianteira. Escalávamos então as copas das árvores e conquistávamos arranhões genuínos que, misturados aos de Sabrina, camuflavam a atmosfera ao nosso redor. Éramos todos nós meninos arranhados, machucados. Durante aqueles dias eternos das nossas sonhadas férias escolares.
Um dia, Sabrina não veio brincar com a gente na rua. Esperamos por ela na esquina, por horas, sem sucesso. Mas ela não veio. Dias depois soubemos que Sabrina havia deixado de existir, havia escolhido ir embora, para um lugar onde jamais poderíamos encontrá-la. Sabrina havia partido para o mundo dos sonhos, minha mãe me explicara com olhos derretendo de lágrimas. Aquela tragédia. Aquele verão de 89.
Nós, porém, escolhemos acreditar que Sabrina havia ido povoar um outro planeta. Ou governar uma terra distante. Sabrina, e seus olhos cor de água, cabelos ondulados e vestidos surrados. Quando fecho os olhos ainda consigo ver as dobras no canto de sua boca, quando ela nos presenteava com um de seus sorrisos acanhados.
A verdade é que ela se foi, sim, e nos levou com ela. De alguma forma nos levou com ela. Para sempre.
A verdade é que ela se foi, sim, e nos levou com ela. De alguma forma nos levou com ela. Para sempre.
Porque a vida nunca mais foi a mesma depois do verão de 89.
quarta-feira, 24 de outubro de 2012
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