terça-feira, 2 de agosto de 2011

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: STRANGERS ON A TRAIN

"Pacto Sinistro" (Strangers on a train - 1951): 2 homens se conhecem casualmente numa viagem de trem. A partir deste encontro, descobrem partilhar um problema: um deseja se livrar de sua ex-mulher problemática. O outro, de seu pai. Eis que surge uma ideia: e se os dois resolvessem o problema um do outro, assassinando a mulher o pai? Isso criaria o crime perfeito, sem suspeita. Mas rapidamente as coisas fogem do controle e o que parecia um fácil desenlace se transforma numa caótica corrida pela inocência. Não é o melhor filme de Hitchcock, sem dúvidas, mas merece estar em qualquer maratona.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: VERTIGO

"Um corpo que vai" (Vertigo - 1958): Homem luta contra um trauma que parece perseguú-lo como uma piada de mau gosto. Uma mulher misteriosa que vira a sua vida de ponta cabeça. Segredos, tramas, loucura, realidade, devaneio? Um filme surpreendente do primeiro ao último segundo. No Top 5 Hitchcock, sem esforço.

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: ROPE

"Festim Diabólico" (Rope - 1948): 2 homens (seriam amantes?) decidem matar um rapaz exemplar pelo puro prazer de experimentar o poder de um homem sobre a vida de outro. Melhor, decidem esconder o corpo no meio da sala, sob o disfarce de uma mesa de festa. Super-homens infalíveis. Um filme sem cortes, meio teatro, meio revelação. Moderno demais até para os dias de hoje. Obrigatório.

MARATONA HITCHCOCK EM PALAVRAS BREVES: PSYCHO

"Psicose" (Psycho - 1960): Moça ambiciosa foge com o dinheiro do patrão, alheia ao perigo na esquina. Aterrorizante, supreendente e moderno. Impossível de refilmar. Um filme que brinca com a nossa cabeça o tempo todo; uma provocação constante e irresistível. Sinônimo de cinema.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

PARA VER E OUVIR: JOHN MAYER TRIO ("WHO DID YOU THINK I WAS")


Bill Murray vestido de Elvis apresentando o trio é too cool for school...

sábado, 23 de julho de 2011

ILUSTRANDO

Carybé - "Figuras na Praia"

O PRISIONEIRO

Naquele espaço delimitado, nem muito grande nem muito pequeno, ele circulava com passos curtos para que não fizesse mais barulho que o necessário. Fazia suas refeições e cumpria a agenda fisiológica com o cuidado minucioso para que não causasse transtornos mais do que o necessário. Deitado, sobre seu fino colchão, num tablado onde esticava os seus ossos, tentava refazer mentalmente todos os passos que o haviam levado até ali. Em vão. Já não lembrava mais. Aquela prisão era o que havia restado, de onde ele contemplava os sons e as cores do mundo, apertando o seu rosto enrugado por entre as grades. 

Gostava de ver as crianças em suas bicicletas, não muito longe dali; os animais errantes, os pássaros sobre os fios de eletricidade e um aroma distante de almoço caseiro sendo feito. Se fizesse um esforço, fechava os olhos e fingia estar em outro lugar. Às vezes simulava-se invisível, desenhado seu desaparecimento por entre as sombras daquele espaço apertado onde fabricava a sua sobrevivência diariamente. Sem incomodar, mais que o necessário. 

Elaborava rotinas simples que o ajudavam a esgotar as horas e debruçava-se, afoito, sobre uma estante de livros: o único (e raro) prazer que o fora permitido. Ele não tinha mais nada, absolutamente nada, a não ser aquelas roupas puídas que cobriam seu corpo, sapatos gastos, uma escova de dentes e um punhado de livros escorados uns sobre os outros, numa estante que ele fazia questão de deixar sempre limpa e organizada. Eram suas posses mais preciosas, seus portais secretos, suas ruas e avenidas que o transportavam para outros lugares onde ele se acreditava feliz. 

Mas mesmo esse privilégio era controlado, verificado e autorizado. Sem excessos, sem exageiros. Como se aqueles livros inofensivos - quase inúteis - fossem um pecado ou crime de estado que mereciam punição. Os livros eram um benefício supervisionado que, com alguma ajuda e artifícios infantis, podia ser contornado. Com alguma criatividade, ele conseguia intercambiar aquela sua moeda amarelada em troca de leituras mais frescas, mais novas, que o deliciavam por dias até que ele se visse mais uma vez relendo todos os livros novamente. 

Em dias mais felizes, conseguia simular sorrisos diante de um espelho envelhecido que quase não oferecia mais reflexo. Era onde acompanhava o seu inevitável envelhecimento. Em dias mais difíceis, escorava-se num canto, como uma criança, e derramava um punhado de lágrimas sinceras, soluçando em silêncio para não incomodar seu captor mais do que o necessário; o que nem sempre era possível e quando ele menos percebia, já estava sendo açoitado novamente. Sem entender ao certo o porquê. Os golpes em suas costas, deixando-o em carne viva, até ser devolvido à cela, onde se deitava com cuidado, estralando aquele corpo cansado, que rangia como uma porta. 

A exaustão era o seu remédio. Assim ele via o dia desaparecer sob suas pálpebras. Até que um raio raquítico de luz, que atravessava o quarto pela pequena janela acima da cama, avisava-o que era hora de começar tudo de novo. Já não sabia mais a contagem das horas e dos dias e, para não enlouquecer, monitorava a passagem do tempo pelo crescimento de suas unhas, barba e cabelo, cortados em caráter espartano. Semanalmente, de três em três dias, mensalmente. Não havia como fugir.

Mas... e se ele pedisse o divórcio?

domingo, 10 de julho de 2011

segunda-feira, 4 de julho de 2011

JANE FONDA E UM CORPINHO IRRESISTÍVEL

Jane Fonda, mais uma cat person, e sua siamesa. Um corpinho irresistível.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

O NÚMERO

Ela sempre tinha muitos lugares para ir, contatos a fazer, coisas a resolver. Equilibrava, como uma malabarista, uma agenda diária de banalidades e assuntos de vida ou morte. Era uma mulher ocupada demais. Ocupada demais para o seu casamento, seus filhos, para si mesma.

Numa terça-feira, seu marido ligou três vezes no seu celular. Precisava dizer algo que ela nunca tinha tempo suficiente para ouvir. "À noite nós falamos sobre isso", respondia no automático sem nem processar as palavras do outro lado da linha. 

Na quarta ligação, desligou sem atender. Na quinta, desligou o aparelho.

À noite, em casa, não encontrou seu marido, que havia sofrido um acidente de trânsito e morrido no caminho para o hospital. O choque da notícia a obrigou a visualizar um slide-show mental em sua mente; imagens rápidas, frenéticas; pulos de tempo e espaço que misturavam sorrisos inocentes, roupas de festa, areia de praia, cheiro de tinta e malas de viagem. Um resumo da vida. Daquela vida, já tão estrangeira, que nem parecia tão dela.

Conversou com agentes de trânsito, com médicos, agentes funerários e filhos. Resolveu pendências burocráticas, financeiras. Enterrou seu marido numa manhã ensolarada, com cara de feriado, em que dezenas de pessoas de rostos completamente desconhecidos suspiravam diante do caixão que descia lentamente aqueles longos sete palmos.

Recebeu pêsames, abraços e palavras de conforto sinceras e fabricadas. Despediu-se de todos e deixou filhos com avós porque "precisava ficar sozinha por algum tempo, para se recuperar". Mas isso não a impediu de resolver assuntos de trabalho na manhã seguinte. Sofreu, sim, aquela perda. Mas seguiu em frente supreendendo a si mesma. Não se julgava tão inabalável.

E se passaram dias, semanas, meses. Um tempo corrido, de novos malabarismos e afazeres inadiáveis.

Numa noite qualquer, porém, verificando mensagens e ligações antigas no seu celular, parou quase imobilizada diante de um número. Aquelas ligações insistentes. Aquele número na agenda do seu celular. Lá estava ele, aquele número para o qual ela nunca mais ligaria, nem receberia ligações. Aquele vestígio eletrônico que carregou sobre ela uma presença e uma ausência do tamanho do mundo.

Deu-se conta de que precisava apagá-lo. E deletou o número, num pranto silencioso e trêmulo. Quase incrédulo, um quase espanto, um quase transe. Como se uma sombra a estivesse engolindo. Um abismo sem fundo.

Foi quando, para o seu inexplicável desespero, ela percebeu que o seu marido estava morto.

domingo, 26 de junho de 2011

(ALGUMAS) RAZÕES DE EU AMAR IAN MCKELLEN

Não precisa dizer muito. Ele é o Gandalf E o Magneto. Ponto final.

terça-feira, 21 de junho de 2011

PARA VER E OUVIR: "GRAVITY" (JOHN MAYER - "WHERE THE LIGHT IS" LIVE)

ILUSTRANDO

"Vampira" - Joseph Minton

PARADOXO

O gato que se acha... um gato?

quinta-feira, 16 de junho de 2011

TESOURINHOS


Nova animação do "Simon's Cat".

sexta-feira, 10 de junho de 2011

ALICE E A GRAVIDADE

Desde criança, Alice nunca gostou muito da gravidade. Era uma menina estranha, todos sabiam, dada a abraçar árvores e a questionar o inquestionável. Não por acaso, dizia querer ser astronauta quando crescesse. Não como todas crianças dizem. Alice realmente não entendia a gravidade. Porque sentia, desde muito pequena, que seu corpo não era puxado para a terra, mas empurrado para longe dela. Alice não se sentia muito deste mundo, na verdade.

Por obrigação, pela necessidade de aceitar os fatos, Alice fingia respeitar a gravidade. Mas isso se limitava ao contexto escolar e a discussões em que era preciso aceitar o conceito de Newton para evitar ser considerada louca. Mas era só fingimento. A gravidade não servia para Alice. E, no fim das contas, ela pouco se importava que achassem que ela era louca. Até gostava disso.

O dia mais triste de toda a existência de Alice foi quando ela soube que seu pai havia morrido. "A gravidade é assim. Ela puxa os homens bons para ela", chorou em silêncio, com mais um de seus "pensamentos de Alice" que ninguém conseguia ou tentava compreender. "A gravidade procura os homens de bem, como uma sereia".

Naquele mesmo dia, porém, como todos os loucos eventos na vida de Alice, ela descobriu estar grávida. E se viu então dividida entre a gravidade e a gravidez. E concluiu, em mais um "raciocínio de Alice", que a primeira havia puxado seu pai e a segunda atraído o seu filho. E decidiu que o segundo teria o nome do primeiro. Como numa trégua.

Mas o armistício durou pouco e Alice se viu novamente em conflito com a gravidade. Teria seu filho no espaço, se fosse possível. Para que ela nunca o achasse e ele vivesse escondido, a salvo, como o príncipe pequenino de Saint-Exupéry. Isolado, tranquilo, senhor de seu planeta, longe da gravidade que só servia para separar Alice das pessoas que amava. Mas mesmo Alice sabia que isso não era possível. E ela se pegava sorrindo, saboreando seu devaneio inocente, com a mão descansada sobre a imensa barriga que surgia sob seu vestido, como um monte.

Mas a paz entre Alice a gravidade chegaria de forma inusitada. Num voo de Roma, indo para a casa de seus pais, Alice entrou em trabalho de parto, minutos antes de o avião pousar. Chorou radiante, aquele choro de grávida meio sem explicação, porque havia compreendido, então, que "logo ela, a gravidade, é quem iria apresentá-la a seu filho".

Sorriu, olhando nos olhos semi-cerrados de seu filho em seu colo. Ele dormia. E os dois estavam felizes.

Era uma manhã ensolarada, preguiçosa, aquela que se projetava dentro do quarto de hospital onde Alice e seu filho repousavam. Uma destas manhãs que parecem perdidas no tempo.

A manhã em que a Alice e a gravidade fizeram as pazes.

domingo, 5 de junho de 2011

POEMA ESQUISITO - ADÉLIA PRADO


Dói-me a cabeça aos trinta e nove anos.
Não é hábito. É rarissimamente que ela dói.
Ninguém tem culpa.
Meu pai, minha mãe descansaram seus fardos,
não existe mais o modo
de eles terem seus olhos sobre mim.
Mãe, ô mãe, ô pai, meu pai. Onde estão escondidos?
É dentro de mim que eles estão.
Não fiz mausoléu para eles, pus os dois no chão.
Nasceu lá, porque quis, um pé de saudade roxa
que abunda nos cemitérios.
Quem plantou foi o vento, a água da chuva.
Quem vai matar é o sol.
Passou finados não fui lá, aniversário também não.
Pra quê, se pra chorar qualquer lugar me cabe?
É de tanto lembrá-los que eu não vou.
Ôôôô pai
Ôôôô mãe
Dentro de mim eles respondem
tenazes e duros,
porque o zelo do espírito é sem meiguices:
Ôôôô fia.

ILUSTRANDO

Detalhe do gigantesco painel "A Coroação de Napoleão" (Le Sacre de Napoleon), de Jacque-Louis David 

O MENINO, O FANTASMA, A SOLIDÃO, OS GIGANTES

Trailer de lançamento da coleção em HD da Team Ico, com os clássicos do PS2 "Ico", a triste história de um menino abandonado que precisa salvar uma prisioneira de um castelo; e "Shadow of the colossus", a solitária jornada de um rapaz que, para salvar sua amada, lança-se destemidamente contra gigantes espalhados por uma vastidão de perigos e silêncios. Dois jogos inesquecíveis, que ganharam status de arte e romperam a barreira entre videogame e cultura. Uma prévia imperdível enquanto esperamos por "The Last Guardian", que encerra a trilogia em 2012.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

PARA VER E OUVIR: AIMEE MANN ("GUYS LIKE ME")


Apesar de não ter o "ver", vale e muito pelo "ouvir". Linda música de grandes implicações autobiográficas.

ATROPELAMENTO

Este final de semana fui atropelado, sem nenhuma sombra de compaixão, por "Old Boy", poderoso(íssimo) filme do sul coreano Chan-wook Park e estrelado por Min-sik Choi no papel do atormentado Oh Dae-Su. A história, aos meus olhos, é uma combinação de "V de Vingança" com "Réquiem para um sonho", só que mais visceral, mais orgânico, mais dolorido, mais... grego. É basicamente isso. "Old Boy" é uma Tragédia grega (com "T" maiúsculo mesmo), só que ambientada na Coréia do Sul. Com uma edição moderna (quase pop) e uma fabulosa direção e direção de arte, acompanhamos o trágico destino de Oh Dae-Su que, um belo dia, é sequestrado enquanto falava com sua filha ao telefone. Subitamente, ele acorda num cativeiro, onde é mantido preso (quase domesticado) por nada menos que 15 anos. O desejo de vingança começa a corroê-lo. "Quem eu ofendi?". "Quem poderia me querer tão mal". E entre os questionamentos e dúvidas, a certeza crescente de que ele fugirá daquela prisão para encontrar seus inimigos e fazê-los em pedaços e comer um a um. E isso é o que o motiva, diariamente, enquanto vê os anos passarem como num relógio confuso. Ao sair, consegue o apoio de uma sushi-girl chamada Mido, que o auxilia em rastrear seu captor. E ele o encontra, enfim, para descobrir a verdadeira punição e o real valor de uma vingança. É quando tudo, como ponteiros de um relógio, gira em direções variadas. 360 graus. E tomamos conhecimento do triste destino de Oh Dae-Su. Não haveria vítimas nem vilões, afinal? Quem são os reais prisioneiros e captores? Poético, arrasador, visceral. Um atropelamento em forma de filme. E absolutamente imperdível.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

quarta-feira, 18 de maio de 2011

AMOR PLATÔNICO

Kirsten Dunst, o mais belo par de olhos tristes do cinema. Virgem, suicida, vampira, princesa. Kirsten Dunst é a personificação da doce melancolia. Única e muitas, meio séria, meio desvairada, como uma criança capaz de pregar peças, aprisionada no corpo de uma mulher. Ou uma senhora, de alma muito antiga, aprisionada no corpo de uma mulher misteriosa. Magra, sinuosa, elegante, flutuante, meio gato. É difícil ignorar Kirsten Dunst. Ela rouba o olhar, como uma fotografia imaginária de Claire Colburn. Ela é meio drama, meio mágica, meio música, meio choro, meio riso sem graça. Meio gueixa ocidental. Vários papéis seus me marcaram profundamente e alimentaram mais esta paixão platônica.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

A MÁGICA POLAROID DE TARKOVSKI

O olhar mágico de Tarkovski através de sua polaroid.



UM FILME FLUTUANTE, VOADOR

Revi, recentemente, um filme como se fosse a primeira vez. Trata-se de "O Clã das Adagas Voadoras" (House of flying daggers), lindo e arrebatador filme do mestre Zhang Yimou, estrelado pela sempre eficientíssima Zhang Ziyi e o surpreendente Takeshi Kaneshiro. A trama é simples: assassinato e um punhado de surpresas cercam uma paixão fulminante que surge no calor da batalha. Jin (Kaneshiro) é um policial incumbido de escoltar Mei (Ziyi), uma assassina do famoso clã das Adagas Voadoras. Sua missão é descobrir o esconderijo do grupo e, enfim, subjugá-lo. No caminho, porém, nenhum dos dois antecipou o que poderia acontecer: eles se apaixonam perdidamente um pelo outro. E, assim, passamos a acompanhar os desdobramentos desta linda história de amor, cercada de perigos, lutas sangrentas e algumas surpresas e traições no caminho. Um filme mágico, delicado (íssimo), atemporal, flutuante. Uma fotografia completamente onírica, como se estívessemos sob o efeito de algum encanto. Imperdível e obrigatório para fãs de filmes como "Herói" e "O Tigre e o Dragão".

domingo, 8 de maio de 2011

AMOR PLATÔNICO

Zhang Ziyi. A minha primeira-dama de musas orientais. Guerreira, dançarina, fantasma. Zhang Ziyi não anda, flutua. Ela é de outro tempo. Melhor, ela é atemporal. Com seus traços delicados, tem um destes rostos que parecem desenhados, como um ideograma vermelho, perfeito, sobre um pavilhão de seda. Ela é meio vento, meio água, meio pássaro. Meio vidro, meio poeira, meio sombra. Como se pudesse ser levada embora por uma brisa mais forte, ou se romper em milhões de pedaços, como cristal. Ao mesmo tempo, comunica poder, vigor e grandeza, com movimentos contidos, precisos de assassina letal. E assim, Zhang Ziyi também é fogo, rocha, dragão. Uma paixão platônica do outro lado do mundo, do outro lado de uma grande muralha, de onde contemplo-a com grande distância e admiração. Como se a observasse da lua.

terça-feira, 3 de maio de 2011

LOS ANGELES, CIDADE PERMITIDA

Aguardando ansiosamente pelo lançamento do novo blockbuster da Rockstar: "LA NOIRE". A partir de 17 de maio, Los Angeles será minha cidade permitida.

ILUSTRANDO

Erich Heckel - Paisagem próxima a Dresden

segunda-feira, 2 de maio de 2011

FILMES QUE COMBINAM

Gattaca ("Gattaca", Andrew Niccol - 1997): Num futuro não muito distante, o mundo volta a ter ares dos anos 50 e os pais podem escolher cada detalhe genético dos seus filhos, antes de eles nascerem, evitando todo o tipo de imperfeição e criando, assim, seres humanos perfeitos. As crianças, concebidas naturalmente, são estigmatizadas como "filhos de Deus" ou "de-gene-rados" e perdem toda e qualquer chance de ascensão social. Ethan Hawke vive Vincent, um menino concebido de forma natural e que sonha em ser um piloto numa missão a Saturno. Mas sua miopia e problemas cardíacos o condenam como um "inválido". Para perseguir o seu sonho de infância, ele contrata os serviços de um comerciante do submundo que consegue falsas identidades genéticas que abrem as portas para a carreira espacial. Desde que ele seja responsável por hábitos espartanos de higiene e se mantenha à sombra, nada o impedirá de viajar. Mas um assassinato repentino põe tudo à perder quando um simples cílio o coloca imediatamente como suspeito. Gattaca é um filme sobre a luta desesperada contra a pré-determinação da vida. Ser obrigado a aceitar um destino imutável. Um filme sobre a dor de existir, sobre a imperfeição e o drama de enfrentar um sistema que decide, no berço, o futuro de uma criança.

Não me abandone jamais ("Never let me go", Mark Romanek - 2010): Se filmes pudessem ter almas gêmeas, Gattaca e Never let me go seriam um exemplo perfeito. Baseada em livro homônimo de Kazuo Ishiguro, a história narra a trajetória desesperada de 3 jovens que descobrem, muito cedo, um destino cruel: são clones e vivem para o único objetivo de gerarem órgãos saudáveis para os seus "originais". Seres humanos com prazo de validade, eles aguardam a concretização de suas missões, aceitando tristemente suas condições de existências inferiores. Um filme que grita e que chora; e que nos leva consigo durante cada segundo de sua projeção. Uma linda, comovente e aterrorizante história sobre a impossibilidade de se vencer o destino, o tempo e a vida - que passa para todos. Sem exceção.

Dois filmes que combinam.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

AMOR PLATÔNICO

Florence Welch, da 'Florence & the Machine'. Será do meu fraco (raquítico, anêmico) pelas ruivas? Não sei bem explicar o que é. Se o cabelo vermelho, o nariz proeminente, o rosto de bruxa ou essa garganta, esses pulmões (não à toa seu disco se chama 'Lungs') que produz uma voz que, como a da Sade, também não pertence a esse mundo. Porque Florence também é alienígena. Se Sade é de Marte, ela deve ser de Saturno. Florence é um acontecimento, uma explosão contida em cada nota que ela parece gritar e sussurrar em igual proporção. Ela não canta. Transpira, confessa. Ofegante, agressiva e delicada, como fogos de artifício. A paixão por Florence é platônica e resignada, também como a Sade. Florence é informação demais para mim. Mulher demais, cantora demais, bruxa demais. É um veneno estranho, um vermelho estranho, esse de Florence, que seduz e entorpece. Música de ninar, de ouvir com olhos fechados e pés inquietos.

PARA VER E OUVIR: FLORENCE & THE MACHINE ("I'M NOT CALLING YOU A LIAR")

quinta-feira, 28 de abril de 2011

MEU CONVIDADO FAVORITO

Não se fala em outra essa semana a não ser no casamento do Príncipe William. Apesar de ser um entusiasta da monarquia Inglesa, a mais tradicional do planeta (afinal, são tantos reis e rainhas famosos que parecem até fazer parte da nossa história), confesso que descobri hoje meu convidado favorito na pompa real. Seu nome é Larry e ele é o "gato oficial" da residência do primeiro-ministro David Cameron. Ele estará presente à cerimônia, como um dos quase 2000 mil convidados. Vale lembrar que nem o Obama ou o Sarkozy foram convidados. Na foto, Larry em seu traje oficial para o casamento.

terça-feira, 26 de abril de 2011

A MONTANHA


The Mountain from Terje Sorgjerd on Vimeo.

Um fotógrafo criou um vídeo a partir de 16.500 fotos retiradas em uma semana. O norueguês Terje Sorgjerd demonstrou grande paciência, ao captar fotos (de 20 em 20 minutos) da Via Láctea no topo do vulcão El Teide, em Tenerife. A cada foto, a câmera era empurrada alguns centímetros por um trilho. O efeito final é comovente e de tirar o fôlego. Como se a terra estivesse parada sob um domo de luz e movimento. É um planeta lindo demais esse nosso.

sábado, 23 de abril de 2011

EU ANDAREI VESTIDO...

...Com as roupas e as armas de Jorge. Hoje e durante todos os dias de minha vida. Salve, salve, Jorge. Afasta-me de todo o mal.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

NA NATUREZA SELVAGEM

Mais uma traquinagem do gatinho mais querido da internet...

quarta-feira, 20 de abril de 2011

"A ÁRVORE DA VIDA"

Trailer do aguardadíssimo filme de Terrence Malick, "The Tree of Life", com Sean Penn e Brad Pitt.

terça-feira, 19 de abril de 2011

ILUSTRANDO

Pablo Picasso - "Mulheres correndo na praia"

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O ARMÁRIO E A LUTA

Neste final de semana lutamos muito. Contra os números. Contra nós mesmos. Contra as chaves. Contra um armário que, como o de Nárnia, poderia nos transportar para um mundo paralelo. Lutamos num jogo, também, e nos divertimos como duas crianças. Rimos de nossas trapaças. Rimos de nós mesmos, como melhor sabemos fazer. E vencemos o armário mágico, carinhosamente chamado de "o defunto" exposto, logo ali, sob o sol, como um indigente. Teríamos também (re)aberto as portas para aquele nosso mundo esquecido? Nossa Nárnia sempre esteve ali, ela nunca desapareceu. Tampouco a esquecemos. Só estivemos longe. Agora, estamos de volta. Você e eu.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

A LOJA DO GATO DO SIMON

Eis uma notícia de sexta-feira bem surpreendente. O Gato do Simon (Simon´s Cat) agora possui uma loja online (em Português) para clientes no Brasil. Além de produtos do famoso gatinho impertinente, a loja apóia uma ONG de proteção e adoção de gatinhos abandonados, a Toca dos Gatinhos. Já os amo imensamente.
Esse é o Tico, um dos gatinhos cuidados pela ONG Toca dos Gatinhos.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

FOTOGENIA FELINA

Uma empresa chinesa criou a MeowPix, uma câmera fotográfica exclusiva para tirar fotos dos gatinhos. Além da conferir um ar retrô às fotografias (35mm), a câmera emite alguns miados para garantir a concentração destes bichinhos que se destraem tão facilmente... Mais um utensílho para paparicar esses seres incríveis e esquisitos que a gente ama incondicionalmente (e com tão pouca contrapartida).

terça-feira, 12 de abril de 2011

AO MESTRE, COM CARINHO

Singela homenagem e lembrança ao aniversário de 80 anos do mestre do humor no Brasil. Um camaleão, um gato de 1000 vidas. São tantos personagens incríveis e tão bem feitos que fica difícil acreditar que todos são um mesmo Chico Anysio. Alberto Roberto, Pantaleão, Justo Veríssimo, Bozó, Coalhada, tantos, tantos. E, claro, o inesquecível Painho. Chico deveria ser tombado como patrimônio da humanidade. Simples assim.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

MELANCHOLIA


Melancholia from Zentropa on Vimeo.

Trailer do novo filme de Lars Von Trier, "Melancholia". Supostamente, "um lindo filme sobre o fim do mundo", estrelado pela minha querida Kirsten Dunst (o trailer me remeteu imediatamente à sua interpretação de Maria Antoineta). Duas irmãs questionam a sua relação enquanto um planeta ameaça colidir com a Terra. Pelo trailer - e pelo que se pode esperar de Trier - é, no mínimo, interessante(íssimo). Ainda sem data de lançamento.

terça-feira, 5 de abril de 2011

ILUSTRANDO

George Frederick Watts - "Moça com cabelo vermelho"

quinta-feira, 31 de março de 2011

ILUSTRANDO

Roy Lichtenstein - "Drawing for a Kiss V"

FILMES QUE COMBINAM

Pequena Miss Sunshine ("Little Miss Sunshine", Jonathan Dayton e Valerie Faris - 2006): Uma excêntrica família norte-americana cruza o país com um único objetivo em mente: realizar o sonho de  uma garotinha gorducha que quer ganhar um concurso de modelo infantil. Numa kombi amarela e caindo aos pedaços, pai, mãe, avô, tio (suicida) e um irmão adolescente se unem e vencem as diferenças num lindo e ensolarado filme capaz de fazer rir e chorar. Uma pequena grande aventura sobre o poder e a importância das pessoas com as quais somos obrigados a conviver. Aquelas pessoas que, nos momentos realmente importantes, ficam do nosso lado.

O Hospedeiro ("Gwoemul", Joon-ho Bong - 2006): Surpreendente filme de terror/ficção sul-coreano. Numa manhã qualquer, um monstro surge inexplicavelmente e começa a aterrorizar uma cidade. Entre o caos promovido pelas pessoas em fuga desesperada, o monstro rapta uma garotinha e a leva embora para o seu refúgio. A partir de então, uma família extremamente pitoresca e disfuncional parte em seu resgate. Indo na contramão dos fugitivos e das orientações do exército, um pai arregimenta os demais familiares numa perigosa busca em que todos deverão descobrir talentos inatos (ou desconhecidos) para enfrentar um perigo impensável. No fim das contas, entre monstros e segredos de governo, uma demonstração de amor capaz de unir uma família em torno de um único objetivo: o amor por uma garotinha que cometeu o erro de estar num parque num dia de sol. Pérola do cinema da Coréia do Sul e um filme imperdível.

Dois filmes que combinam.

segunda-feira, 28 de março de 2011

ABRAÇO DE LEÃO


O carinho de um leão por sua tratadora, na Colômbia. Inacreditável. Quem não quer um abraço assim?

sexta-feira, 25 de março de 2011

O CASO DO ASSASSINO DE ANJOS

"Eu sou o anjo caído.
Eu sou luz.

Meu Deus, eu fiz novamente".

* * *

Luis não se considerava o homem mais corajoso do mundo, tampouco se achava covarde. Não era bonito, nem viril, nem o mais forte, mas também não era dos piores. Pelo menos, nenhuma de suas namoradas eventuais havia reclamado. Era um sujeito mediano, sossegado, meio desimportante, destes que não chamam muita atenção.

Meio invisível, achava, o que para ele era uma excelente qualidade de detetive. Entrou para a polícia por conta de suas próprias cicatrizes emocionais. Órfão de pai e mãe, viu sua família ser brutalmente assassinada quando não tinha nem 6 anos de idade. Numa madrugada qualquer, seus pais e irmãos foram mortos e apenas ele sobreviveu. Buscava, assim, entre os policiais, uma família postiça e um meio para resolver esses fantasmas que atormentavam o seu sono.

Não era o melhor policial, claro, mas isso também não o impedia de resolver alguns casos e assuntos importantes. De todos eles, porém, Luís se sentia impelido em resolver o famoso "caso do Assassino dos Anjos". Conhecido, nos bastidores da polícia, como um caso sem solução.

O Assassino dos Anjos não deixava bons rastros e não se permitia classificar. Matava homens e mulheres, jovens e velhos, sem um padrão muito detalhado. A única coisa que permitia ligar os crimes era a maneira como os corpos eram encontrados. Nus, deitados de bruços e enterrados em covas rasas. Em suas costas, asas rústicas desenhadas com o sangue das próprias vítimas. Nenhuma outra violência era cometida, a não ser por uma longa perfuração no peito, feita sem muito critério com algum objeto não cortante, como uma chave-de-fenda, possivelmente.

Era a única repetição do assassino. Pessoas desaparecidas que eram encontradas dias depois, semi-enterradas e com suas asas vermelhas mal desenhadas. O sangue, já seco, ganhava contornos cor de vinho, como tatuagens pré-históricas. Jovens corretores, enfermeiras idosas, crianças em idade escolar. Ao mínimo sinal de desaparecimento, a polícia já se mobilizava para encontrar um anjo antes que fosse tarde demais.

Ninguém conseguia entender as motivações por trás daqueles crimes. E Luís tampouco. Debruçava-se, horas a fio, sobre fotos, notícias e dossiês, tentando ler as entrelinhas daquela série de crimes que se sobrepunham num infinito de informações cifradas, como um labirinto. Café esfriando sobre a mesa, olhos vermelhos de cansaço contemplando costas nuas, gordas, magras, definidas. Costas de velhos e de modelos. Pobres almas unidas pela sina de se tornarem os anjos de sangue do assassino que aterrorizava a cidade havia meses.

Solitário, Luís voltava todas as noites para o seu obscuro apartamento, sempre com um vazio no peito. O vazio de não cumprir seu dever. O vazio de não ter ninguém para retornar. Não havia se casado, não tinha família. Não conseguia criar laços, acreditava. Não tinha "jeito com pessoas".

Caminhava, a passos lentos; a calçada mal iluminada e inundada por aquela penumbra da madrugada que parece esconder todo o tipo de perigo. Um silêncio esquisito, interrompido por alguns barulhos distantes, como gatos revirando latas de lixo. Um vento cortante, invadindo seu corpo por baixo do casaco pesado. Chuva fina.

Um barulho chama a atenção de Luís num beco, adiante. Um homem encostado na parede, fumando, olhos escondidos sob uma cortina gris. Os dois se olham por longos segundos até que o estranho oferece um cigarro a Luís. "Maldita madrugada fria". Não suportava cigarros, mas Luís aceita a gentileza. As mãos de ambos se tocam durante um breve instante, onde dedos incompetentes tentam fazer a chama do isqueiro sobreviver ao vento e à chuva.

Um vento quente invadindo boca, pescoço, pulmão, narinas. Uma sensação estranha, amarga e saborosa.

Naquela noite, Luís chegou em casa exausto, cansado demais até para um banho. Respirava pesadamente, como se tivesse subido pelas escadas. Olhou-se no espelho do banheiro, tocando seu rosto pálido com as mãos vermelhas e sujas de terra. E, balbuciando qualquer coisa inaudível até para si mesmo, apagou a luz para dormir.

"Meu Deus, eu fiz novamente".

quarta-feira, 23 de março de 2011

ADEUS A UMA DEUSA

Hoje se despede deste plano terrestre mais uma deusa imperfeita. Elizabeth Taylor (1932-2011). Hoje o cinema perde o mais lindo par de olhos violetas e muito de sua mágica. No célebre papel da Rainha Cleópatra descobri mais uma de minhas inúmeras paixões platônicas. O mundo amanhece mais cinza nesta quarta-feira.

segunda-feira, 21 de março de 2011

O REINO DOS ÓRFÃOS

Ubirajara, mais conhecido como "vô Bira", era um sujeito incomum. Hippie inveterado, socialista fervoroso, sentia orgulho de ostentar uma longa cabeleira prateada que, ocasionalmente, prendia num descuidado rabo-de-cavalo. Meio extraterrestre, seu lugar preferido - e refúgio - era uma chácara a quase 2 horas de distância da cidade, onde passava os seus dias conversando com passarinhos, pescando peixes num lago - para em seguida devolvê-los à água - e matando mosquitos com os pés, hobby responsável por um punhado de mesas quebradas, marcas de pés nas paredes e três divórcios.

Ele vivia como um hermitão, feliz, sempre de pés descalços. Era de sua "herança indígena", ele dizia orgulhosamente quando recusava, pela centésima vez, um par de sapatos de presente. Gostava de caminhar com os pés no chão, tão sujos e mal tratados, que era quase como se ele tivesse desenvolvido uma sandália orgânica que deixava uma silhueta inconfundível na parede após mais uma tentativa de extermínio de zumbidos.

Vô Bira gostava da natureza. De tirar fotos das árvores, de tomar banho sem roupa no rio, de deitar sob o sol e comer frutas e legumes frescos, ainda com aquele aroma de terra. Não tinha inibições nem quando deixava a todos desconfortáveis com alguns de seus hábitos de nudismo ou mera falta de traquejo social.

Ninguém lembrava, ao certo, quando ele havia comprado roupas novas. Era impossível lembrar. Uma foto antiga, do primeiro casamento, era a lembrança coletiva de todos. Vô Bira vestindo terno e gravata. Depois disso, camisetas manchadas e shorts tão furados que pareciam tangas, como se ele estivesse enrolado em uma rede artesanal de pesca. Ele pouco se importava. E ria, um riso solto, uma gargalhada inocente de quem descobriu, antes de todos, que não faz muito sentido em se preocupar tanto com as miudezas que nos tornam civilizados.

Ele não gostava de dinheiro. Nem de televisão. Nem dos correios. Nem de colônia pós-barba. Gostava da sua casa, da sua bagunça ordenada e do que a vida ao seu redor provia. Frutas, legumes, um pequenino cercado onde criava galinhas. Sentia pena de cada uma que abatia, claro, e sempre fazia questão de cumprir todos os rituais funerários. Mas era impossível, mesmo para ele, abrir mão do seu prazer mais mundano: galinha assada, com batatas e arroz.

Não bebia. Não muito, pelo menos. Nem fumava, salvo por alguns charutos que ele gostava muito mais pelo aroma da fumaça e pelo fato de que o hábito ocasional o fazia lembrar Fidel Castro. Quem fizesse a comparação ganhava muitos pontos de simpatia com o vô Bira.

Tinha dois cães e dois gatos que viviam harmoniosamente. "Os animais são socialistas!", dizia, da janela de casa, apontando para os animais juntos no quintal. Vô Bira gostava das crianças da família. Dos netos novos. Dos novos casamentos e das formaturas. Celebrava as pequenas conquistas de todos e nunca esquecia de nenhum dos aniversários. Cada aniversariante da família podia ter pelo menos uma certeza em seu dia: de que receberia uma ligação, no raiar da manhã, com uma voz rouca e melodiosa do outro lado da linha cantando - com fortíssimo sotaque - alguma canção de Bob Dylan, dos Beatles ou dos Rolling Stones. "Sympathy for the Devil", foi a minha última. Acho que mais por uma provocação a minha mãe do que qualquer outra coisa. Sorrio, todas as vezes que lembro disso.

Mas que criaturas misteriosas somos nós, que nos permitimos afastar de um ser de outro planeta como era o nosso avô Ubirajara. Um personagem de livro que vivia ali, a quase duas horas de nós. Deixamos esse tempo passar e não aproveitamos a sua companhia. Quase nada dela, salvo pelas obrigações familiares. Alguns por falta de tempo, outros por vergonha, outros tantos por incômodos quaisquer. A verdade é que deixamos o vô Bira de lado, em detrimento da "vida que importava". Deixamos ele passar.

Quando ele morreu, somente então, percebemos o valor daquela existência escondida, no meio do mato, entre os bichos e as frutas. Mas era tarde demais.

Fechar a casa do vô Bira pela última vez. Vendida. Futura pousada. E então, só então, descobrimos a desesperadora impossibilidade de voltar o tempo perdido e o reino de órfãos que, repentinamente, havíamos nos tornado.

sexta-feira, 18 de março de 2011

FILMES QUE COMBINAM

Como John Cusack que, no imperdível "Alta Fidelidade" (High Fidelity), adora imaginar listas para tudo, eu gosto de elaborar um pequeno passatempo cinematográfico muito simples: imaginar sessões duplas de filmes. O objetivo é juntar dois filmes que tenham alguma relação seja no roteiro, temática, cenário, época, enfim, alguma conexão subjetiva. Mas o desafio é fugir do óbvio, porque eles não podem ser intimamente relacionados. Inauguro essa reflexão aqui com uma sessão dupla de cinema que há um bom tempo pretendo fazer:
Viagem a Darjeeling ("Darjeeling Limited", Wes Anderson - 2007): Três irmãos decidem buscar auto-conhecimento e aproximação numa pitoresca viagem de trem pela Índia. O Darjeeling Limited é o cenário (e o microcosmos) onde eles trocam memórias e mágoas novas e antigas. O plano é simples: se (re)conhecerem enquanto chegam a um mosteiro onde a mãe deles decidiu se tornar freira. Um filme alegre e ocasionalmente melancólico, excêntrico e comovente recheado com câmeras lentas lindas de morrer...
Assassinato no Orient Express ("Murder on the orient express", Sydney Lumet - 1974): Na famosa história de Agatha Christie, passageiros encontram-se no Orient Express, o famoso e luxuoso trem que, em 1935, fica preso numa tempestade. Durante a madrugada, um milionário que havia sido ameaçado de morte é assassinado e, rapidamente, todos os seus passageiros são suspeitos. Cabe ao inesquecível detetive Hercule Poirot desvendar esse mistério. Um filme imperdível para amantes do gênero e uma ótima companhia para o trem desgovernado dos irmãos Whitman, que se perdem e se encontram sob o sol escaldante da Índia.

Dois filmes que combinam.

quinta-feira, 17 de março de 2011

SÓ PORQUE EU NUNCA MAIS HAVIA FALADO NELES...

É um amor difícil de explicar. Meio platônico, acho. Eles não dão nenhuma bola para a gente (para nada, na verdade). Mas é impossível não amá-los perdidamente.

terça-feira, 15 de março de 2011

MUITAS FOTOS, POUCAS PALAVRAS

As fotos e vídeos da tragédia no Japão andam deixando pouco espaço para as palavras. Meus mais sinceros pensamentos a este povo tão (infelizmente) acostumado a se refazer no caos.

sexta-feira, 11 de março de 2011

O INCIDENTE

Aquela família jamais seria a mesma. Após o incidente, tudo havia ganhado outras cores e profundidades, como se pairasse no ar uma suspeita, um perigo, um segredo. Olhavam-se, em silêncio, durante todas as refeições. Escondendo-se, uns dos outros, como se vestissem máscaras de um carnaval em Veneza. O incidente havia mudado tudo. Para sempre.

As conversas eram pautadas por amenidades. Nada que importasse. Conversas anestésicas, sem grandes propósitos. Risos postiços, toques forçados sem nenhuma intenção real de carinho. Desde o incidente, eles haviam se tornado estranhos. Quase inimigos. Não sabiam mais como lidar com a convivência diária. Haviam se tornado estrangeiros naquela modesta casa onde cinco pessoas pareciam ocupar o espaço de um exército.

O pai saía, todas as manhãs para trabalhar. Saía e voltava com o mesmo punhado de palavras necessárias. A mãe ficava, quase todo o dia, na cozinha e orquestrando as atividades da máquina doméstica. Comida, limpeza, roupas. Ações automáticas e precisas, similares ao do seu marido, que do outro lado da cidade soldava componentes de eletrodomésticos. Mãos e pernas que pensavam pela cabeça. Olhos para guiar no percurso, ausência quase completa de pensamentos. Assim era depois do incidente. Era melhor não pensar em nada.

Os dois filhos mais velhos ficavam quase todo o dia fora. Um para cumprir uma exaustiva agenda de estudos e trabalho. Outro para uma agenda mais flexível, geralmente sem nenhum propósito construtivo. Mas nem por isso deixava de chegar em casa no cair da madrugada. Na solitária companhia da mãe ficava a filha mais nova, pré-adolescente, que estudava pela manhã e ajudava a mãe durante os afazeres da tarde. Silenciosa, como se muda, navegava os poucos cômodos como um fantasma. Aquela menina de olhos trágicos e vestidos puídos que ficavam cada vez mais curtos diante dos olhos de todos.

O incidente havia mudado tudo. Havia destruído aquela família. Eles não conseguiam mais olhar nos olhos uns dos outros. Não sabiam o que dizer, o que perguntar. Não riam. Não havia música. Quando muito o silêncio embalado pelas notícias sem importância na televisão. Eles eram estátuas de cera vivas, ocupando espaços em conjunto, convivendo com dificuldade. Habitantes de um labirinto. Prisioneiros sem muros.

Pela manhã, logo cedo, começava o pior de todos os rituais familiares. Tomar café, naquela mesa de toalha florida onde os braços e cotovelos quase podiam se tocar. Mãos que trocavam desastradamente facas e manteiga com grande inibição. Olhares ressabiados, pernas inquietas sob a mesa. Os filhos exalando um cheiro misturado de sabão e desodorante. Aquele cheiro de quem começa uma nova jornada diária. A mãe ainda de camisola, os cabelos amarrados sem rigor atrás da cabeça. O pai transpirando álcool em excesso da noite anterior. Todos os dias. Depois do incidente, tomar café juntos se transformou numa sessão de tortura para aquela família.

Como um batalhão dispersado, cada um praticamente saltava da cadeira para cumprir as obrigações necessárias ou mesmo inúteis. E o silêncio tomava conta, mais uma vez, da casa. A mãe recolhia os pratos, como uma cega, tateando os utensílhos sobre a mesa. O pai se arrastava para a porta, como se carregasse uma tonelada sobre suas costas cansadas de trabalhador braçal. Olhava para a mulher, de costas, na cozinha, lavando pratos. Um barulho excessivo de louça na pia, como se para abafar algo. Como se ela gritasse e aquela louça balançando violentamente pudesse fazer algo para abafar o barulho que vinha de sua mente. Ameaçava ir ao seu encontro e tocar o seu ombro. Mas desistia todas as vezes.

O sol invadindo lentamente a sala. Móveis baratos, flores de plástico. Tudo coberto por uma iluminação pobre que, ao final do dia, produzia um desagradável cheiro de coisa mofada.

O incidente havia mudado tudo, não havia como negar.

Aquela era uma família de pessoas infelizes. Reféns de um segredo. Eles que, em companhia de seus travesseiros, pediam secretamente, todas as noites, para não acordar no dia seguinte.

Aquelas pobres seis pessoas.

quinta-feira, 10 de março de 2011

ILUSTRANDO

Frida Kahlo - "As duas Fridas Kahlo"

quarta-feira, 9 de março de 2011

PARA VER E OUVIR: GROOVE ARMADA ("MY FRIEND")


Música número 1 para o retorno de um feriadão. Duvido que alguém discorde.

sexta-feira, 4 de março de 2011

quarta-feira, 2 de março de 2011

PARA VER E OUVIR: THE STROKES ("UNDER COVER OF DARKNESS")


Primeiro clipe da banda em meia década.

PARA VER E OUVIR: CHET BAKER ("SOMEONE TO WATCH OVER ME")


Às vezes é só isso que a gente precisa.