sábado, 22 de outubro de 2011

O PLANETA TRISTEZA

"A terra é um planeta maligno", nos diz Justine em determinado momento de "Melancholia", o novo filme de Lars von Trier. "A vida na terra, pelo menos, é". Difícil falar, explicar esse filme. Eu mesmo não sei ao certo o quanto gostei, o quanto odiei. Não é, nem de perto, difícil de engolir como "O Anticristo" mas isso não o impede de ser igualmente confuso e quase inacessível. Há um certo autismo na obra de von Trier e é preciso ter isso em mente antes de embarcar em um filme seu. Na tela, uma trama sem começo nem fim, tampouco muita explicação. Em 2 atos, o filme primeiro nos mostra Justine (interpretada pela sempre magistral Kirsten Dunst), que vai se casar numa linda propriedade no campo. Um casamento de sonhos, com um homem que parece amá-la perdidamente. Mas algo errado com Justine. Há um monstro a devorando por dentro que, pouco a pouco, percebemos se tratar de uma depressão profunda, uma tristeza abissal, uma amargura desesperadora que faz com que, para ela, a felicidade seja algo inatingível. Filha de pais desajustados, ela parece ser uma pessoa montada por cacos, uma sobrevivente. Ao seu lado, Claire (Charlotte Gainsbourg), a irmã mais velha e que percebemos ser seu único ponto de apoio diante do abismo que parece engolí-la vagarosamente.
Cheio de simbolismos e mistérios, "Melancholia" tem algo de sonho e algo de pesadelo

Mas não há perfeição neste relacionamento, longe disso. Há uma série de sussurros que parecem conversar segredos daquela família e que von Trier não faz questão nenhuma que compreendamos. Justine e Claire são, basicamente, duas sobreviventes. Ao redor desta confusa teia familiar está a notícia de que um planeta chamado Melancholia está em rota de colisão com a terra e não se sabe se ele simplesmente passará por perto ou colidirá em cheio. E, assim, há uma expectativa angustiante, sufocante, em torno da ideia de que todos morrerão catastroficamente a qualquer momento. Uma contagem regressiva que põe tudo em cheque. A vida, subitamente, vai chegar ao fim. E aí lembramos da reflexão de Justine sobre a vida na terra e percebemos que, sem sombra de dúvidas, essa é a menor preocupação de von Trier. Um filme difícil, muito dificil, certamente. Mas que fica na lembrança. Ouvi dizer por aí que "Melancholia" seria a alma gêmea de "Árvore da Vida". Engano absurdo. Os dois filmes são inimigos mortais.

Um comentário:

Ione disse...

Sua resenha fez com que minha hesitação em voltar a Von Trier (depois do Anticristo) ,aumentasse...
Mas achei muito poética a maneira que escreveu sobre ''Melancholia''.