"Torna-te quem tu és", diz um pensamento famoso de Nietzsche. Algo curioso aconteceu (continua acontecendo) comigo. Sinto como se meu sotaque estivesse mais característico, mais próximo do típico, ao invés de disfarçado, amenizado, como procuramos fazer ao mudar de cidade; a velha estatégia de adaptação ou coisa do gênero. "Misturar e sobreviver". E não é que eu quis assim. Aliás sempre tentei o oposto, numa busca - infantil - de ser neutro, de não vestir uma bandeira, uma regionalidade na fala, no jeito. Nos esforçamos demais em ser quem não somos, num exaustivo processo de forçada metamorfose. Mas, quando menos esperava, simplesmente me percebi voltando a falar desde jeito "diferente", de vogais abertas e expressões pitorescas; sem vergonha nenhuma de "cantar" de vez em quando na fala, como se todo o tempo do mundo estivesse disponível. E mais, eu gosto disso! Acho que faz cada vez mais sentido para mim a idéia de que quando a gente se afasta das nossas origens, elas voltam abruptamente como uma revelação; de que nós devemos ser quem somos. Eu não sou brasiliense, nem paulista, nem gaúcho. Nem mineiro. Nem carioca. Eu sou baiano e, ora, falo como se fala na Bahia, por que cresci ouvindo a língua portuguesa como ela foi fundada e amadurecida na Bahia, com suas características engraçadas, com o sotaque inigualável, com os neulogismos, com a cultura-paralela que ninguém entende e que faz da Bahia um estado como nenhum outro. Se pensarmos os estados brasileiros como conjuntos, podemos inserir São Paulo, Minas e Rio em um. Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina em outro. Os estados amazônicos em outro, os do nordeste em mais um, aliás como já estão formadas as regiões brasileiras. Mas em nenhum deles se insere a Bahia; não por que "a Bahia é linda", esse argumento caetaniano não funciona muito bem. A Bahia é linda e é triste. Mas não tem nada igual a essa coisa toda, negra, africana, mistíca, mágica, de mar, de calor, contas de santos, capoeira, especiarias, cacau, compotas, Jorge Amado, Dorival Caymmi, tabuleiro de baiana; não dá para encontrar coisa igual no Brasil. Nem parecido. Então acho que resolvi, de uma vez por todas, ficar em paz com tudo isso, aceitando "quem sou". Continuo sendo um crítico ferrenho de Salvador e suas terríveis idiosincrasias; e vou ser eternamente, mas abraço carinhosamente o estado de onde venho. E neste aspecto, abraço também meu sotaque e o meu jeito, pouco me importando se acham engraçado, preguiçoso; enfim, é quem eu sou. Não importa que lugares do mundo eu conheça, nada vai mudar o fato que, no fim das contas, é da Bahia que eu vim. E quer saber? Isso é muito legal.
terça-feira, 22 de julho de 2008
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