terça-feira, 16 de junho de 2015

"NÃO VAMOS VOLTAR AQUI NUNCA MAIS..."


Quando enfim pusemos os pés fora do aeroporto, não havia mais volta, não havia mais dúvida. Estávamos em Paris; aquele misto de sono e sonho, cansaço, você descobrindo como iríamos para a cidade, eu tomando conta das nossas malas. Um bocejo, um suspiro, aquele cheiro de cidade velha. 

Você retornou e parou no caminho, me olhando. Era visível o seu olhar de reprovação. Eu havia sacado uma boina da mochila, e estava ali, te esperando, emulando um ar de sofisticação. 

"Você está parecendo o Chevy Chase naquele filme", você comentou sem muita paciência.

Tirei a boina, com certa resignação. "Férias frustradas na Europa". Ri, enquanto entrávamos no táxi.

Você conversava com o taxista num francês fluente, alienígena para mim infelizmente. Eu percebia, conseguia captar uma palavra ou outra, perdida na tradução; o nome da rua onde ficaríamos hospedados, coisas assim. 

Encostei a testa na janela, contemplando a luz e as sombras das árvores, dos prédios antigos, as calçadas, as lojas, os barulhos, aquela gente francesa. Fechei os olhos por alguns instantes, saborando aquele momento.

Segurei na sua mão, fazendo carinho, você retribuiu sem deixar de conversar com o motorista. 

Vivemos a intensidade de um tempo sem fim naqueles dias breves. Ainda sinto o cheiro de pão, de café, de vinho, todos os sabores, o cheiro do seu cabelo enquanto nos beijávamos na rua. O gosto do seu corpo quando fazíamos amor, a textura suave da sua pele branca, sob as pontas dos meus dedos.

É um grande clichê que ficamos mais românticos em Paris; mas é verdade. Caminhamos o tempo todo de mãos dadas, nos abraçávamos sem justificativa, como se fôssemos as únicas pessoas do mundo, "tu e eu", naquele caleidoscópio de memórias incríveis que eu quase sentia culpa em experimentar. 

Você me mostrou tudo, me ensinou tudo, ocasionalmente sem paciência. A minha caminhada lenta, o acidente recente ainda cobrando pedágio do meu joelho esquerdo, me fazendo mancar. A bengala que eu infelizmente ainda precisava usar. Não que você estivesse impaciente com o meu passo lento, era a minha tentativa de charme em torno daquilo que te irritava; meu caminhar de cavalheiro de bengala em Paris. E eu ria enquanto você acelerava na minha frente.

Desculpe. Eu sou assim.

Você me apresentou uma cidade de sonho, que eu não esperava ver tão cedo; circunavegando a minha alma perdida, quase infantil, ignorante. Eu saboreava a folha caída no chão, enquanto você me contava algo curioso sobre uma rua. 

"O que eu acabei de dizer?", você chamava a minha atenção. Mas eu estava prestando atenção, juro; ao meu jeito, mas estava. As obras de arte, os cafés, os parques cheios de namorados, meu Imperador amado que você me levou para reverenciar. Eu juro que estava guardando tudo, minhas fotografias e notas mentais.

É impressionante como tudo ainda está tão vivo dentro de mim, como se a cidade ainda pulsasse diante dos meus olhos incrédulos. O cair da noite, as luzes, o vento dentro da roupa, o seu beijo me procurando, o calor de estar ali, do seu lado, cercado por tanta beleza antiga. Você me mostrou a sua Paris e eu me apaixonei por ela irremediavelmente. Por ela. Por você. 


"Não sente saudade de Paris?", você me perguntou dia desses, por trás da sua xícara de café.

A verdade é que prefiro não pensar muito nisso. E parafraseio "Lost in Translation"; não pretendo voltar ali nunca mais.

Se não for com você.

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