Modigliani - "Retrato de uma moça" (1917)
quinta-feira, 26 de agosto de 2010
quarta-feira, 25 de agosto de 2010
SABER DA VIDA
"O que sei eu sobre a vida?". Esta reflexão é, para mim, tão antiga quanto as mais remotas lembranças. Lembro de ter pelo menos cinco anos de idade e, conversando com colegas de recreio, ter a plena certeza de que já havia "entendido" tudo a ser compreendido. Jovem, adolescente, universitário. Sempre me imaginava em plena compreensão da vida. E hoje, com três décadas completas, vejo o como eu realmente nunca soube de nada. No entanto, contraditoriamente, eu me acho novamente senhor de "tudo o que tiver a ser sabido sobre a vida".
Mas o que sei eu sobre a vida? Dada essa minha experiência de mais de 25 anos em, olhando para trás, perceber que eu nunca soube nada sobre nada; só posso crer que eu, realmente, não sei absolutamente nada sobre a minha vida. Sobre a existência. Ainda que eu ache que sei tudo. Porque tenho certeza que, quando completar 40 anos, olharei para esses dias de hoje rindo da minha inocência. E quando completar 50 darei risada dos meus 40. E assim por diante. Imagino.
Mas se, de fato, isso é algo progressivo, ou seja, nós sempre sabemos de tudo e vamos descobrindo gradualmente que não sabemos de nada, então não chegamos a nenhum lugar de plena sabedoria! Ou, pelo menos, sabedoria REAL. Porque, por esse meu raciocínio de filósofo de orelhas de livros, se eu chegar aos 100 anos vou me imaginar sábio e terei pena do meu eu aos 90. Mas e se eu fizer 110 anos me enxergarei ignorante aos 100!
Acho, em verdade, que não há nenhuma sabedoria a ser dominada no sentido de "saber sobre a vida". Talvez porque essa sabedoria tenha prazo de validade e expire conforme passem os anos. Afinal, que sabia eu da vida aos cinco anos? Sabia dos lanches, do recreio, das figurinhas e dos super-heróis. E sabia de tudo isso com muita propriedade. E, assim, sabia de tudo sobre a vida. Naquela época. O mesmo vale para as etapas seguintes, de modo que hoje eu sei tudo sobre a minha vida sem que isso exclua o fato de que, em 10 ou 20 anos, eu saberei que, na verdade, nunca soube sobre nada.
Haveria algo melhor, então, do que simplesmente viver um dia após o outro? Quando ingresso nessas minhas infrutíferas caçadas ao meu próprio rabo, constato que há uma bênção na mais profunda ignorância. No sentido em que o melhor a ser feito é abraçar o dia de hoje porque nada se sabe sobre o dia de amanhã. Com isso, essa angústia existencial é resolvida com uma xícara de café fumegante e a observação da chuva insistente na janela.
E sorrio, com a certeza, mesmo ignorante, de que sou feliz.
segunda-feira, 23 de agosto de 2010
sexta-feira, 20 de agosto de 2010
"TODA VELHICE É UMA ESPÉCIE DE SAUDADE", DE JOSÉ REZENDE JR.
Microcontos de José Rezende Jr. de uma beleza que chega a doer:
"A mulher que se despia para nós penteava nossos cabelos, procurava sujo atrás das orelhas, conferia nossas febres. Feito mãe, só que pelada."
...
"Chamávamos o doido pelo apelido que mais odiava. Ele respondia com pedras pontiagudas e pontaria certeira. Mas acho que o feríamos mais."
...
"Na missa, o sermão nos ameaçava com castigos atrozes. No banheiro, os gozos ardiam como se expelíssemos a própria lava do inferno."
...
"Matavam com gosto cobras e escorpiões. Eu morria de dó: de quem é a culpa, quando já nascemos com o veneno no corpo?"
...
"Meu pai escreveu num caderno o próprio nome e os nomes de cada filho. Continuou lendo, mesmo depois que as palavras perderam o sentido."
...
"Todos os anos o mesmo circo. A mesma menina trapezista, peitinhos sempre em botão, feito trapézios suspensos no tempo. Só nós envelhecíamos."
quarta-feira, 18 de agosto de 2010
terça-feira, 17 de agosto de 2010
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
PARA VER E OUVIR: MAYSA CANTA "NE ME QUITTE PAS"
Impossível não se curvar para esta mulher. Apresentação de arrepiar dos pés à cabeça.
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quinta-feira, 12 de agosto de 2010
A MANIA DE CHESTER
Alguns gatos gostam de roubar e esconder cotonetes, brincar com saquinhos plásticos e beber água da pia (relatos de experiências pessoais). Outros, como Chester, gostam, simplesmente, de ficar de mãos dadas...
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
ILUSTRANDO
Pela alegria de uma quarta-feira "banal". Ilustração de Amarílis Lage, no Cartolina.
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terça-feira, 10 de agosto de 2010
"UM DIA, MEU FILHO, VOCÊ SERÁ O REI DA SAVANA"
Flagra mostra um leão adulto caminhando com o seu filhote num rochedo na Tanzânia. Não dá para negar que a foto lembra a famosa animação da Disney, "O Rei Leão". Se tem algo, nesse mundo, do qual eu não me canso nunca é esta beleza profunda da natureza.
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quinta-feira, 5 de agosto de 2010
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
CAFÉ PARA ALICE
Estavam exaustos. Haviam feito amor por toda a noite e já tinham perdido a noção do tempo. Ouviam a respiração silenciosa um do outro enquanto entrelaçavam dedos carentes e pés curiosos. Fazia calor e o teto do quarto parecia ganhar contornos especiais, com as sombras que começavam a se desfazer, feito nuvens num céu de mentira. Sobre os lençois, completamente desfeitos, os dois observavam o sol surgir preguiçosamente na janela. Raios irregulares de luz cortando o quarto como uma cama de gato.
Ele gostava de ver a luz contornando o lindo corpo de Alice, como uma cordilheira no horizonte. Ela estava de costas para ele, completamente nua, os cabelos avermelhados soltos sobre o travesseiro. E os olhos dele pontuavam, como cartógrafos, o brilho que gradativamente percorria seu pescoço, ombros, costas, cintura, nádegas, pernas, pés. Aquele corpo que ele buscava com avidez e que conhecia tão bem; cada esquina, cada rua e reentrância.
Esticou o braço direito como se apontasse para uma direção e tocou, com a ponta dos dedos, a tatuagem que Alice ostentava na base das costas. Um símbolo do zodíaco que ele nunca conseguia lembrar ao certo o significado. Mas não fazia diferença. Ele adorava aquela tatuagem, adorava beijar aquela tatuagem, e acariciava o pequeno desenho como se o refizesse por cima do original, observando os pêlos de Alice se manifestarem como grama alta no vento. De olhos fechados, o rosto completamente banhado na luz matutina, Alice agradecia os carinhos em silêncio.
Os dois se amavam e se conheciam há tanto tempo que já nem sabiam ao certo a contagem precisa dos anos. Mas eram muitos. Eles eram jovens, eram sós e tinham naquela cumplicidade misteriosa, naquela amizade de corpos e almas, um compromisso.
Mas havia duas coisas que eles não sabiam. A primeira era que Alice estava grávida. A segunda, é que ele iria embora naquela manhã.
Um cigarro aceso pendia desleixadamente da mão dele. A fumaça, cinza azulada, subia pelo seu rosto criando novos ares para as suas ideias confusas. Suas ideias desesperadas de fuga. Ele amava Alice profundamente, mas não conseguia mais suportar a ideia de pertencer a alguém. De alma livre, forasteira, ele queria fugir. E havia feito isso desde quando conseguia se lembrar. Ele fugia de todas as amarras, de todos os laços. Assim foi com a escola, com trabalhos prolongados, com a sua mãe e seus irmãos. Ele não criava raízes. Não por maldade, talvez por fraqueza. O fato é que ele era um fugitivo.
Alice havia adormecido. Cobriu o corpo e se encolheu de um lado da cama. Era assim que ela dormia, ele sabia. Olhou-a por alguns segundos, com uma mistura de raiva, dor e paixão, enquanto abotoava a camisa amassada. Enxugou uma lágrima solitária e se confortou com um pensamento rarefeito de que "assim é que são as coisas". Sem perguntas, sem respostas, somente o movimento. Seria melhor não para ele, mas, principalmente, para ela. "Alice merece tanto mais".
Calçou os sapatos e caminhou vagarosamente para a porta, de onde olhou para ela por mais alguns instantes. Guardaria para sempre aquela mulher inesquecível. Aquela menina, grande demais para o mundo, que possuia respostas para todas as perguntas e abraçava a vida como uma criança. Alice o ensinara a viver quando ele já havia desistido de tentar novamente. Nunca a havia amado tanto como naquele momento. Mas ele era um covarde e preferiu atender ao seu chamado original de ir embora, mesmo sem sequer saber para onde.
Fechou a porta com cuidado para não acordá-la. Preferiu as escadas ao elevador. Na calçada, fez um aceno breve para um táxi, que parou metros adiante. Caminhou, sem olhar para trás, até parar ao lado do carro branco e azul. O motorista o observava, com um misto de dúvida e impaciência, mas ele se recusava a entrar. Desculpou-se e fechou a porta, vendo o carro partir em velocidade. Sorriu e atravessou a rua, para onde um homem corpulento e simpático abria uma padaria.
Alice havia adormecido. Cobriu o corpo e se encolheu de um lado da cama. Era assim que ela dormia, ele sabia. Olhou-a por alguns segundos, com uma mistura de raiva, dor e paixão, enquanto abotoava a camisa amassada. Enxugou uma lágrima solitária e se confortou com um pensamento rarefeito de que "assim é que são as coisas". Sem perguntas, sem respostas, somente o movimento. Seria melhor não para ele, mas, principalmente, para ela. "Alice merece tanto mais".
Calçou os sapatos e caminhou vagarosamente para a porta, de onde olhou para ela por mais alguns instantes. Guardaria para sempre aquela mulher inesquecível. Aquela menina, grande demais para o mundo, que possuia respostas para todas as perguntas e abraçava a vida como uma criança. Alice o ensinara a viver quando ele já havia desistido de tentar novamente. Nunca a havia amado tanto como naquele momento. Mas ele era um covarde e preferiu atender ao seu chamado original de ir embora, mesmo sem sequer saber para onde.
Fechou a porta com cuidado para não acordá-la. Preferiu as escadas ao elevador. Na calçada, fez um aceno breve para um táxi, que parou metros adiante. Caminhou, sem olhar para trás, até parar ao lado do carro branco e azul. O motorista o observava, com um misto de dúvida e impaciência, mas ele se recusava a entrar. Desculpou-se e fechou a porta, vendo o carro partir em velocidade. Sorriu e atravessou a rua, para onde um homem corpulento e simpático abria uma padaria.
Subiu correndo as escadas, que rangiam sob os seus pés afoitos como se uma multidão aplaudisse aquela curta maratona. E abriu a porta do quarto com pressa, encontrando Alice de pé, à janela. Ela sorriu melancolicamente e os dois parlamentaram em silêncio por não mais que três segundos. Era tudo tão simples, afinal de contas. Alice era a exceção.
"Achei que você tivesse ido embora".
"Achei que você gostaria de pães e café".
Viveriam juntos, até o final de suas vidas.
terça-feira, 3 de agosto de 2010
CINEMATERAPIA COM "ASSASSINATO POR MORTE"
Os melhores detetives do mundo são convidados por Lionel Twain, um excêntrico milionário, para um casual "jantar com morte". Ao chegarem na mansão de Twain, os experts são recepcionados por um mordomo cego, uma copeira surda-muda e uma série de eventos estranhos que envolvem todos numa rede sem pé bem cabeça de mistérios. Esse é o enredo de "Assassinato por Morte" (Murder by Death). O filme, de 1976, é uma paródia às tramas de mistério (em especial as de Agatha Christie), nas quais um círculo de pessoas se vê diante de uma série de mortes em que todos são suspeitos. Trancafiados na casa, eles têm até a manhã seguinte para solucionar o assassinato do próprio anfitrião e ganhar um milhão de dólares como prêmio. Ao final, uma revelação bombástica e sem nenhum compromisso com a verossimilhança. Absurdamente hilário. No elenco de estrelas, destaque para o indefectível Peter Sellers, Alec Guiness e Truman Capote. Um filme delicioso, com um humor inocente, completamente do bem, mas que rende situações simplesmente hilárias. Uma das minhas cenas preferidas: o ataque do inspetor Perrier ao se "envenenar" com um "vinho de má safra". Imperdível cinematerapia da melhor qualidade.
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